A cerveja, como a conhecemos, é uma bebida socializante de baixo ou médio teor alcoólico consumida em baixa temperatura, e que tem a agradável função de reunir amigos e conhecidos na mesa de um bar ou numa confraternização onde, normalmente, churrasco é a comida preferida. É uma bebida fermentada composta de três ingredientes principais, lúpulo, malte, e água, as vezes com adição de açúcares e xaropes que lhe dão sabor diferenciado. Mesmo tendo tão poucos componentes, devido às várias maneiras de fazer e dosagens possíveis de cada uma das partes, é virtualmente a bebida que mais apresenta variações em suas apresentações ao público consumidor, existe mais de oitocentos tipos de cervejas a disposição dos bebedores. É um universo no qual nenhum cervejista militante deixará de ser atendido por mais exigente que seja.
Quanto à história da bebida, onde ela surgiu pela primeira vez, não existe consenso entre os estudiosos do assunto, há indícios que tenha sido no Oriente Médio cerca de seis mil anos atrás. Foram encontrados traços de uma bebida fermentada de malte em ânforas antigas. Feitas as análises químicas constatou-se serem restos de cerveja, aliás, bem parecida com a bebida atual. É provável que do local de origem a bebida tenha se propagado para a Europa e Ásia ainda no tempo de Marco Polo e da Rota da Seda. Há, entretanto, historiadores que colocam sua origem na Mesopotâmia e sua propagação pelo mundo feita pelos romanos durante seu império. Seja onde for e qual povo que a fabricou primeiro, calcula-se que nos anos mil de nossa era já se tornara uma bebida apreciada nos “quatro cantos da Terra”, para usar uma expressão bíblica. Evidente que só onde existiam os ingredientes era possível fabricá-la, assim sendo, nas Américas e na Oceania só foi introduzida após a colonização européia dessas áreas.
Tão fácil é de se fabricar a bebida que aqui no sul do país é comum as famílias terem sempre um estoque das caseiras. Minha mãe fazia uma cervejinha caseira bem razoável, que era consumida principalmente no natal. Em tempo, cerveja caseira se parece com o tradicional chope, não tem conservantes, cuja ausência é que diferencia o chope da cerveja engarrafada ou enlatada.
Pois é, sendo uma bebida “importada” no sentido que aqui aportou trazida pelos imigrantes europeus, tornou-se nacional na medida em que foi adotada pelos brasileiros como bebida predileta, assim como o vinho o é para os franceses. Além disso, sofreu “tropicalização” no modo de ser consumida, pois aqui é impensável bebê-la em temperatura ambiente, só se consome gelada, e, estranhamente, até “estupidamente gelada” o que é uma aberração. Vejamos por que. As baixas temperaturas inibem as papilas gustativas de nossa língua, aqueles receptores que são responsáveis pela percepção do sabor das coisas que deglutimos. Com as papilas impedidas de analisar o gosto pelo líquido congelante, todos os sabores se parecem, não existe cerveja boa ou ruim. O bebedor que pede uma “estupidamente” faz jus à pedida, é um estúpido. “Loura gelada” é convidativa e sensual, congelante é para os que nada sabem da arte de beber.
E por falar em pecado, mais uma vez o bebedor desavisado atenta contra as normas não escritas de como se saboreia uma boa cerveja, ao pedir “sem colarinho”. Como sabemos, o “colarinho” da bebida é aquela espuma de dióxido de carbono que se sobrepõe ao líquido no copo. Pois é, aquela porção de espuma é, justamente, o que impede o líquido de entrar em contacto com o ar ambiente. A ciência nos diz que a atmosfera contém alguma coisa como 21 por cento de oxigênio, e é esse elemento, aliás, maior responsável pela vida do Planeta, que “ataca” o líquido cervejal deixando-o “choco”. Assim, ao se expor a cerveja ao oxigênio está se permitindo que este reaja com o líquido como o faz com tudo que toca. O oxigênio é responsável pela oxidação dos metais ferrosos a qual é chamada de ferrugem. Quase todos os elementos são atacados pelo oxigênio com exceção dos chamados metais nobres como ouro e platina, que são, justamente, nobres por que se mantêm inalterados na presença do elemento O², o que não acontece com nossa cervejinha do dia-a-dia, que fica “choca”, ou seja, oxida-se e se torna intragável para aquele de paladar mais apurado.
Claro que, como “gosto não discute” não há regras invioláveis no que diz respeito à libação dessa apreciada bebida, apenas é de se lamentar que frente um universo tão grande e tão variado, o bebedor brasileiro se atenha apenas às pilsens, sem dar chance a outras variedades tão boas ou melhores que estas. Nos pubs ingleses bebe-se muita cerveja, mas lá o consumidor as pede pelo tipo e não pela marca, o bebedor inglês varia mais suas libações que o cervejeiro tupiniquim.
Não sou cervejeiro, tampouco bebo qualquer bebida alcoólica, mas, durante muitos anos, fui um razoável colecionador de cervejas nacionais em garrafas, cheguei a ter mais de quinhentas. Hoje, por falta de espaço, minha coleção encontra-se espalhada por muitos acervos de colecionadores em vários estados deste país.
As ilustrações do texto são de minha antiga coleção. JAIR, Floripa, 25/07/10.
11 comentários:
Muito bacana! Muitas informações que eu como 'beberrona' desconhecia! E agora vou passar a admirar mais as diferentes 'espécies' de cerveja!
Jair, lendo teu post de hoje sobre a cerveja, me vi quase na obrigação de te mandar um linque blogau, do Botto, mestre cervejeiro, que tive o prazer de conhecer e até já bebemos juntos na casa do Aim, pq eles são amigos. Não sei se havia te falado, mas o Aim faz parte de um grupo, tipo uma associação de cervejeiros artesanais, ACERVA, cuja acho que foi fundada pelo Botto. Eles fazem cervejas excelentes, a do Botto já recebeu alguns prêmios, e, inclusive, a mulher do Botto tbm fabrica e tem uma cerveja premiada. A Bottobier está no mercado, é uma excelente cerveja vendida em barril, mas só nos botecos finos, tipo Aconchego Carioca e Bar da Frente, que leva esse nome pq está situado em frente ao Aconchego. As donas são amigas. Mês passado estive lá na Barão de Iguatemi, no Aconchego Carioca, e sábado agora fui ao Petit Paulette, na mesma rua, para bebemoramos o níver de um amigo, só na base de cervejas finas. Os petiscos são de comer ajoelhado. Muito bons!
Mês passado Aim e Natália estiveram por três dias em Pto. Alegre, para um grande evento que reuniu a nata dos cervejeiros artesanais do Brasil todo. Cada ano rola um evento desse numa capital ou grande cidade, e a arte de cervejar artesanalmente está se espandindo cada vez mais; as premiações acontecem nesses eventos, após várias rodadas de degustações. Eu diria que desde o advento da Bohemia e Original — que nem são excelentes cervejas se comparadas com algumas dessas artesanais —, a percepção dos bebedores de cerveja está se aprimorando.
http://blog.bottobier.com.br/2008/08/05/bares-cariocas-com-boas-cervejas/
Grande abraço,
Ruy.
"Amei",Jair!
Impossível será,daqui para a frente,beber cerveja e não me remeter rapidamente a informações tão preciosas...Você é surpreendente e eu como boa cervejeira,me sinto bastante à vontade para parabenizá-lo pela matéria.
Beijo carinhoso,
Marly
Jair,profunda sua dissertação sobre essa bebida. Lembrei da cerveja caseira e natalina da Tia Leonor. Temperatura fresquinha!Quase germânica, obtida através do poço "dos milagres". Certo?
Beijos,
TeTê
Jair
Gostei bastante deste trabalho, já fui um bebedor brigão, digo, brigão pela causa do bom paladar, estas cervejas mais comuns no mercado, vivem a mudar o sabor, época é mais leve, noutra tem mais álccol, assim vai. Fico estarrecido como os grandes consumidores, se fixam a uma marca, bebem continuadamente e não percebem as alterações. Meu paladar, praticamente, tornou-se intolerante às cervejas, o que de certa forma acho muito bom. Saboreio de vez em quando uma Bohemia. Mas aprecio mesmo, um bom dedinho de cachaça. Tem cada uma...
Vamos responder por ordem cronológica:
Daniela, beba sua cerveja e aprecie mais, mesmo cometendo algum "pecado" como bebê-la "estupidamente" em algum bar da moda em Brasília.
Rui, entrei no saite recomendado e gostei dos cervejeiros blogueiros. A turma é competente. Essas cervejas alternativas de boa qualidade só não são mais abundantes porque a Antártica costuma comprar as empresas e nivelar por baixo a qualidade, ou seja, o rótulo é mantido mas o líquido que a garrafa contém e a Antártica de sempre. Lamentável.
Marly, gostei que você visitou meu blog, mesmo que tenha sido apenas pela "loura gelada". Beba suas cervejinhas e lembre de passar aqui de vez em quando.
Tereza, você lembrou bem, as cervejas caseiras de minha mãe eram refrescadas no "poço dos milagres" e eram tão boas como qualquer "draft" de hoje em dia.
Almirante, obrigado pela visita e gostei de saber que você aprecia uma cachacinha, todo brasileiro devia consumir a água que passarinho não bebe, até porque é a única bebida genuinamente nacional.
Vou mandar sua mensagem aos amigos cervejeiros ,dentre eles há um fabricante caseiro...Abraços.
Luci
Pois é, só tive a oportunidade de degustar diferentes tipos na Europa e nos EUA. Agora tenho outra idéia do que seja uma boa cerveja. Gosto muito da Pale Ale. Não é tão amarga e é mais forte. Bom, como adoro cerveja, vou tentando sempre provar novos sabores. Espero que dê tempo de provar tudo! rs...
Beijos da nora
Muito bom, Jair!
Bateu sem dó nas manias de "estupidamente gelada" e "sem colarinho".
Há pouco tempo, parece que em SC, houve uma questão que chegou até à justiça, sobre uma reclamação do cliente de um bar que reclamou de estar sendo "roubado" pela quantidade de espuma sobre o chope!
No final a decisão (sábia) foi de que a quantidade de espuma sobre o chope estava nos padrões, pois segundo o juiz, "chope sem espuma não é chope"!
Pelo jeito, o juiz também era bom de chope.
Abraços!
Por ordem cronológica:
Luci,
Convido-a a comparecer mais e fazer comentários também.
Camila,
Desejo que você descubra novos sabores da loura aí nos EUA, saiba que, apesar dessas insípidas Buds tão consumidas, existem ótimas cervejas nos bares daí.
Leonel,
Pois é, apesar de minha cota ter acabado e eu não mais consumir bebidas alcoólicas, entendo que os cervejeiros são uma instituição neste Patropi, e um pouco de conhecimento a respeito das cervas não custa nada e pode acrescentar muito mais prazer às libações.
Caro Jair. Este que vos escreve infelizmente é um cidadão que, a se basear no seu texto, está bem próximo da estupidez. Não sou totalmente estúpido pq não aprecio cerveja estupidamente gelada e outra coisa que me afasta de tal classificação, é o fato de gostar do "colarinho". Entretanto, devo confessar, nada sei da arte de beber. O que gosto mesmo é de encostar o umbigo no balcão e pedir uma loira gelada que bebo de golão, nada de degustar. Outra coisa: Não tenho preferência por marca. Estando gelada e acompanhada de tira gosto, qualquer uma desce. Como vê, em se tratando de beber cerveja estou longe de servir de exemplo para qualquer vivente.
Abraço de com força,
Joel.
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