segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Água


É um paradoxo que o Homo sapiens tenha, desde os tempos primitivos, lançado seus detritos e dejetos, justamente, nos cursos d’água, dos quais provém grande parte de sua água potável e, em decorrência, donde pode provir sua saúde ou doença. Contudo, sob condições naturais, os rios e riachos têm poderes consideráveis de se auto limpar. O fluxo de água arrasta os detritos de sais, solo, madeiras, cinzas e pedras para os oceanos e lagos. As bactérias usam o oxigênio dissolvido na água para decompor os detritos orgânicos e, por sua vez, são consumidas pelas plantas e outros organismos que se transformarão em comida dos peixes. As plantas e animais que se valem dessa cadeia alimentar devolvem à biosfera oxigênio e carbono, mantendo o equilíbrio ecológico desse sistema. O inconveniente desse despejo orgânico nas águas é que bactérias se introduzam na água que se vai beber e infectem com doença intestinal o consumidor. Aliás, diarréias e outras infecções intestinais são as maiores causadoras de morte nos países menos desenvolvidos, matam mais que câncer, desastres naturais e acidentes de trânsito somados. O Haiti pós terremoto é uma prova viva dessa terrível e inescapável verdade.

Se a poluição, digamos, “doméstica” acompanha o homem desde suas primeiras sociedades tribais sem consequências muito danosas, o verdadeiro problema surge com a nova ordem urbano-industrial. Em primeiro lugar, a urbe industrial reúne milhares e milhares de pessoas em concentrações absurdas e potencialmente incontroláveis, sanitariamente falando. Os sistemas “naturais” de eliminação de esgotos através de rios se tornam saturados e, como acontece nas grandes cidades brasileiras depois de chuvas intensas, muitas vezes retornam e contaminam ruas, residências, a própria água de beber e os alimentos. Quem já viu o pequeno agricultor dos cinturões verdes das grandes cidades regando os legumes que vamos comer no dia seguinte, já entendeu o risco que corremos. Além disso, os processos industriais aumentam enormemente a gama de materiais que as bactérias não podem eliminar – os não biodegradáveis – e muitos deles são extremamente venenosos, como cianetos ou metais como chumbo e mercúrio. O acúmulo de detritos industriais pode - e normalmente o faz – alcançar o subsolo e o lençol freático, e contaminar a água potável.

Vale lembrar que os detritos orgânicos lançados pelas usinas de açúcar e fábricas de papel podem sobrecarregar os suprimentos disponíveis de oxigênio dissolvido nos rios. As bactérias consomem todo o oxigênio à medida que decompõe essa imensa massa de detritos. Às vezes não sobra absolutamente nada e, como toda vida aquática requer oxigênio, o rio “morre” e fede como o Tietê não nos deixa esquecer. Quanto mais lento for o rio, maior será a possibilidade de ele morrer logo. No Japão, todos os rios nas proximidades de Fuji estão mortos pelas indústrias de papel concentradas naquele sítio.

Mesmo quando sobra algum oxigênio depois que as bactérias executaram sua parte, existe um perigo adicional. A decomposição reduz os detritos a moléculas simples dos elementos básicos – potássio, fósforo, nitrogênio e outros nutrientes. Ora, nutrientes e água formam a interessante matéria conhecida como fertilizante. Grandes colônias de bactérias e algas se desenvolvem a partir desses compostos gerando “florações” que liberam gases fétidos. Ó Tietê, por que me lembro de você? (Perdão leitores, não resisti a este besteirol).

Bem, então chegamos à questão que deve pautar as decisões daqueles que acreditam na sobrevivência do homem, a despeito do... homem. A quantidade de água existente na Terra neste momento é virtualmente a mesma de quando há dois milhões de anos os homídeos formaram seus primeiros clãs, se reuniram nas primeiras sociedades. O Planeta não perde nem “fabrica” água adicional, tampouco esta vem do espaço, estamos usufruindo – muito mal - da mesma água há milhões de anos e, nesse tempo, multiplicamos por bilhões o número de usuários e desenvolvemos zilhões maneiras de poluí-la. Então o que queremos? Nosso projeto é esgotar toda a capacidade da água de se regenerar naturalmente? Estamos, burralmente, nos suicidando de sede e envenenados num futuro imaginável? Respostas. Se não tomarmos ciência que maltratar a água e julgá-la recurso inesgotável é burrice, estaremos escorregando amoque direto para a auto extinção como lemingues correndo para as falésias traiçoeiras e mortais. Ou o Homo coloca a conservação da água no pedestal mais alto de suas prioridades imediatas, ou seremos as últimas gerações que este acolhedor Planeta azul viu nascer e verá morrer. Me permitam fazer um desabafo ainda que provisório: O bicho Homem é um energúmeno que não merece viver no Planeta no qual nasceu. JAIR, Floripa, 30/11/0.


sábado, 27 de novembro de 2010

A religião de Hitler


O nazismo foi o que mais próximo de uma religião nacionalista pode existir. Hitler chegou a dizer para seus seguidores: “Somos mais uma religião que um movimento”. Ele achava que a função do ministro da propaganda, Joseph Goebbels, não era divulgar informação, mas convencer a população sobre a “verdade” do nacional socialismo e pregar “fé incondicional” em tudo que emanasse daquele movimento.

Nascido e educado como católico, Hitler frequentemente costumava recorrer às imagens cristãs para suas analogias. Gostava de se comparar a Jesus ou, num estilo mais judaico, ao Messias prometido. Considerava que as tropas SS (Schutzstaffel) eram sua versão pessoal da Companhia de Jesus. Claro que ele e seus seguidores não tinham interesse nas metas universais do cristianismo, nem passava pelas suas mentes doentias serem misericordiosos e tementes ao Deus cristão. Hitler, ciente da força das igrejas, tomou medidas para restringir o papel delas junto às comunidades alemãs. Contudo, numa atitude de quem concordava que “a religião é o ópio do povo” (Karl Marx), tratou de criar uma base religiosa adequada ao nazismo referindo suas origens às crenças germânicas pré-cristãs. Criava assim a “religião” nacional socialista. Para ele e seus adeptos, o nazismo representava a volta às origens da cultura das antigas tribos teutônicas, guerreiros pagãos que haviam, inclusive, enfrentado as hostes romanas e vencido. Como a cruz representa o cristianismo, a nova religião nazista precisava de um símbolo, então o próprio Hitler sugeriu a suástica. A suástica ou cruz gamada é um símbolo místico encontrado em muitas culturas em tempos diferentes, dos índios Hopi aos Astecas, dos Celtas aos Budistas, dos Gregos aos Hindus e, em geral, representa a fertilidade. Para Hitler, a cruz gamada foi adotada apenas por ser uma logomarca forte, facilmente reconhecível e possível de ser reproduzida por qualquer pessoa.

Numa coerência maldita, o Monstro era fascinado pela guerra e pelo nacional socialismo como religião da guerra. Como afirmam alguns historiadores, grande parte de suas ideias e convicções foram forjadas nas trincheiras do front durante a Grande Guerra de 1914-18. O mísero cabo-estafeta viu milhares de corpos de seus companheiros serem empilhados, depois milhares de outros que os substituíram também serem empilhados, até que uma cegueira parcial causada por gás mostarda o enviou ao hospital em Berlim, onde pode conviver com mutilados, loucos e cegos, e formular aquela ideologia que levaria o mundo à maior guerra da história.

Há consenso entre os estudiosos que, para Hitler, a guerra foi uma experiência de intensidade religiosa. Totalmente puritano em sua devoção à guerra, ele depois escreveu em Mein Kampf que as trincheiras eram “conventos com paredes de fogo”. Vale lembrar que o odioso homem era abstêmio e vegetariano, fortes indícios de pessoa obstinada e de convicções arraigadas.

Assim, a religião nazista não acatava a lógica tradicional cristã que Jesus foi morto pelos judeus, para dar embasamento ao extermínio dos judeus. Na teologia nazista, o crime dos judeus foi ter traído a Alemanha na guerra, a famosa “punhalada nas costas” que Hitler gostava de citar para justificar a derrota alemã. Para eles não importava que os judeus houvessem lutado bravamente na guerra; não importava que os judeus vivessem em harmonia com outros povos da Europa central, inclusive alemães, desde muito antes da criação da própria Alemanha em 1871. Para Hitler o que importava é que eles eram uma odiosa lembrança da derrota e humilhação alemã. E, principalmente, para os alemães recuperarem sua antiga pureza como guerreiros Männerbund, precisavam apagar para sempre essa marca que maculava suas almas: tinham que exterminar esse povo em nome da religião nazismo.

Como qualquer outra religião, o nazismo possuía doutrina rigorosa, adotava rituais próprios, possua seus cantos de louvação, tinha seus dogmas e prometia bem-aventuranças futuras. Em tudo parecida com religiões monoteístas formais, a religião nazista adotava hierarquia canônica tendo o führer como Profeta, Messias e Papa, uma santa trindade incontestável. Abaixo vinham os cardeais, bispos, cônegos e párocos que se encarregavam do proselitismo e do fiel cumprimento de seus ritos por parte dos seguidores. Seguidores estes, tão convictos das verdades pregadas quanto o são os seguidores cristãos, por exemplo. Ainda, como grande parte das demais religiões, os adeptos do nazismo eram submetidos aos ritos de passagem, equivalentes aos batismos dos cristãos e judeus.

A grande sacada de Hitler conseguindo formular o nazismo à feição de religião, foi poder usar as convicções inerentes às crenças que estabelecem o bem e o mal em campos opostos. Assim, quem não era nazista era contra a religião que representava o bem sobre a terra, era um adversário, mais até, um perigoso inimigo que adotava uma religião “do mal”, o qual estava do outro lado do balcão e deveria ser eliminado. Não é a toa que os homens dos Freikorps e Einsatzgruppen não sentiam o menor remorso em atirar a sangue frio em criancinhas de colo, velhos, mulheres e inválidos, eles estavam, como cruzados da era medieval, agindo em nome de Deus. E, como sabemos e as “guerras santas” não nos deixam esquecer: em nome de Deus tudo pode. Por isso tudo, Osama Bin Laden nem original é.

Hitler tinha uma visão messiânica de sua pessoa e, segundo historiadores, isso se deve às várias vezes que ele salvou-se da morte. Desde ter sobrevivido nas fronteiras da grande guerra, até os atentados a que foi submetido na sua carreira política. Essa visão equivocada de si mesmo fornecia o embasamento no qual “fundou” a mais letal visão religiosa de todos os tempos. O mundo nunca mais esquecerá o resultado dessa religião estúpida e mortífera. JAIR, Floripa, 27/11/10.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

Réquiem para "Lady Be Good"


A tragédia dessa aeronave e seus tripulantes têm sido controversa, objeto de literatura alentada e de muitos filmes relacionados. “Lady Be Good”, (nome retirado de um filme musical de 1941) dado à aeronave B-24D Liberator SN 4124301, por sua tripulação, era um dos 639 aviões desse tipo construídos pela Consolidated em San Diego, Califórnia. O B-24D tinha uma envergadura de 33,5 m, peso máximo de decolagem 29500 kg, velocidade máxima perto de 300 MPH, velocidade de cruzeiro 175 mph, alcance 2.850 milhas, tinha um teto de serviço de 28.000 pés, e era equipado com onze metralhadoras ponto 50. Era impulsionado por quatro motores Pratt e Whitney R-1830 de 1200 HP cada. A Consolidated construiu mais de 18 mil Liberatores a partir de 1938 a pedido da USAAF, para substituir o B 17. O “Lady” foi incorporado ao 514º esquadrão, do 376º Grupo de Bombardeiros, da 9ª Força Aérea do Exército Americano.

Em 4 de abril de 1943, o “Lady Be Good” novinho em folha, partiu da base Soluch na Líbia, em sua primeira missão de combate. Fazia parte de uma esquadrilha de sete aeronaves, a qual era parte de um grupo maior de outras cinco esquadrilhas. Eles voariam para Crotone, no sudoeste da Itália, e dali até Nápoles, onde bombardeariam o porto usado pelos alemães. O vôo seria de aproximadamente nove horas. Voos de Soluch não sofriam ataques de caças ou de FAA, mas em compensação, eram conhecidos por seu elevado número de perdas causadas pelas condições do aeródromo situado no deserto líbio. A areia era responsável por um grande número de problemas. Esta missão não foi diferente, alguns B-24s voltaram a Soluch logo após a decolagem devido a panes nos seus sistemas de navegação. Por uma razão desconhecida, trinta minutos antes de chegar a Nápoles, o piloto do LBG abortou a missão, largaram as bombas na água no oceano e voltaram para Soluch. Não há explicação porque foi dada a ordem para abortar, mas deduz-se que as coisas começaram dar errado a partir dessa decisão. As vinte semanas de curso e o pouco treinamento noturno do Tenente Hays, navegador da missão, parecem não terem sido suficientes para um retorno seguro a parir de um ponto desconhecido. A grande catástrofe estava pronta para acontecer.

O “Lady Be Good” agora estava no caminho de volta para o campo Soluch. Mesmo utilizando apenas o cálculo elementar: velocidade X tempo = distância, o navegador supôs que estariam longe de seu destino por volta de meia-noite. Parece que desconsiderou o vento que os tinha retardado na ida e agora adicionava quase trinta nós a sua velocidade indicada, enquanto desviava a aeronave para a direita da rota desejada. O que ficou registrado é que o piloto, Tenente Hatton, informou estar próximo a Benghazi, que ficava cerca de 30 quilômetros ao norte de Soluch. A que se notar que àquela velocidade a aeronave já se encontrava sobre a terra e eles achavam que voavam sobre o Mediterrâneo. Assim, o LBG continuou o fatídico vôo rumo ao desconhecido por mais duas horas. Todos os outros B-24s retornaram com segurança. Foi relatado que ouviu-se uma aeronave B-24 próxima de Soluch pouco antes da meia-noite. Também deve ser salientado que os principais instrumentos de navegação, tais como rádio VHF/DF e bússola magnética estavam funcionando corretamente quando os destroços foram recuperados. O LBG mal fadado estava voando às cegas, sem idéia de sua real posição, continuou até os motores começaram a dar sinais de falta de combustível. Então, o comandante colocou o vôo em piloto automático e ordenou o abandono da aeronave.

Em maio de 1958, uma equipe da British Oil Exploration, sobrevoando o deserto líbio avistou os destroços do ar. Mais tarde, em março de 1959, uma equipe chegou ao local do acidente por terra, 440 quilômetros ao sul de Soluch. A aeronave estava danificada por causa do pouso forçado, mas o equipamento estava surpreendentemente em boas condições e as hélices indicavam que os motores ainda giravam no momento do toque com o solo. As metralhadoras dispararam, o rádio funcionou, e a maioria dos instrumentos estava perfeita. Havia todos os indícios de abandono e, para surpresa dos homens, os coletes salva-vidas não se encontravam a bordo, indicando que eles os haviam levado ao saltarem, supondo que estavam sobre o mar. Nenhum pára-quedas foi encontrado de modo a indicar que toda a tripulação tinha abandonado o avião.

O comandante da Base Aérea Wheelus na Líbia foi notificado da descoberta. Uma equipe do exército baseada em Frankfurt, na Alemanha, foi enviada para tentar localizar os corpos. Muitos itens foram encontrados durante as buscas, tais como botas de voo, coletes salva-vidas e pára-quedas dobrados como flechas apontando o caminho que a tripulação tomou, contrário à localização de Soluch, denotando uma desorientação só explicada pelo erro de navegação o qual os tinha internado no deserto. Depois de busca intensa por meses, os restos mortais não foram encontrados.

Em 11 de fevereiro de 1960, trabalhadores da British Petroleum descobriram os restos de cinco membros da tripulação. Eles encontraram um diário pertencente ao tenente Robert Toner. O diário cobria oito dias de sofrimento humano atroz em um esforço desmedido pela sobrevivência. Notou-se que a tripulação saltou as 02:00 hs do dia 5 de abril de 1943. O tenente John S. Woravka não teve condições de caminhar por exaustão e foi deixado em algum ponto, os oito restantes, aparentemente, cobriram 85 milhas com apenas meio cantil de água cada um. Segundo o diário, três homens, os sargentos Shelley, Moore e Ripslinger haviam sido incumbidos de buscar socorro enquanto os demais ficariam aguardando. Os cinco corpos foram levados para Frankfurt, Alemanha, para identificação.

Uma extensa busca final foi iniciada para encontrar os quatro tripulantes restantes. Aviões de busca da USAF procuraram no deserto tentando localizar algo que pudesse indicar a localização dos desaparecidos. Em 12 de maio de 1960, trabalhadores da British Petroleum encontraram os restos mortais do sargento Guy Shelley a 37 milhas a noroeste dos primeiros cinco tripulantes. Cinco dias depois, em 17 de maio, um helicóptero avistou os restos do sargento Harold Ripslinger a apenas 26 milhas a noroeste dos primeiros cinco tripulantes. Shelley tinha andado um adicional de 11 milhas além de onde Ripslinger tinha caído. A busca foi interrompida alguns dias depois, após resultado negativo em encontrar os dois tripulantes restantes.

Em agosto 1960, outra equipe da BP encontrou os restos mortais do tenente John Woravka a 12 milhas do LBG. Ele ainda usava seu traje de vôo de altitude elevada, Vernon Moore nunca foi encontrado. A operação de busca cobriu 6.300 milhas quadrados.

Muitos itens, como uma hélice, por exemplo, recuperados do LBG foram enviados ao Museu de USAF e ao Museu de Intendência do Exército. O “Lady Be Good” acabou destruído por caçadores de lembranças e por tribos nômades que passaram pelos destroços. Um dos motores encontra-se abandonado junto a um órgão público em Trípoli. Alguns instrumentos foram retirados pelos militares e usados em outros aviões da USAF. Quando a Base Aérea de Wheelus foi fechada em 1971, um vitral memorial foi enviado ao Museu da USAF.

Fica aqui a homenagem a homens colocados em situação-limite, vítimas das restrições de seus equipamentos e da fragilidade de seus corpos mortais, mas com espírito indomável e coragem que lhes permitiram sobreviver por um tempo excepcional em condições extremas de sede, fome e insolação, sob as quais, diz a ciência, ninguém sobreviveria mais que cinco dias. Homens que só sucumbiram porque era impossível sair com vida daquele inferno. A eles nosso profundo pesar e nosso reconhecimento do ferrenho apego à vida que demonstraram.

1º Tenente William J. Hatton, piloto;

2º Tenente Robert F. Toner, co-piloto;

2º Tenente DP Hays, navegador;

2º Tenente JS Woravka, bombardeador;

2º Sargento Guy E. Shelly, artilheiro;

2º Sargento Vernon L. Moore, artilheiro;

2º Sargento Samuel R. Adams, artilheiro;

3º Sargento Harold J. Ripslinger, mecânico;

3º Sargento Robert E. LaMotte, rádio operador.

OBS – Este texto é resultado de várias leituras de artigos e livros, inclusive um artigo de mesmo nome publicado na “Revista Aeronáutica” na década de setenta. Os possíveis erros e omissões devem-se a citações feitas a partir de lembranças não muito recentes e a uma memória sujeita a falhas decorrentes da idade deste autor. Os dados técnicos da aeronave e a relação de nomes foram obtidos na Wikipedia. JAIR, Floripa, 23/09/10.

sábado, 20 de novembro de 2010

A vida secreta das palavras


Para começar, surpreendeu-me que o filme seja espanhol, não estou acostumado assistir bons filmes espanhóis a não ser Almodóvar. Escrito e dirigido por Isabel Coixet, profícua diretora de séries da TV espanhola e com passagem marcante pelo cinema. Tem Tim Robbins numa atuação limitada pelo personagem que está temporariamente cego e acamado, mas com presença bem expressiva e convincente. A canadense Sarah Polley, da qual só lembro de, “As aventuras do Barão Muchausen”, de 1988, está na área desde 1985 e é uma atriz fantástica. Considerando que todos os demais atores do elenco, com exceção de Tim Robbins, apenas marcam presença, a personagem Hannah/Cora de Sarah, carrega o piano e se sai muito bem.




Hannah tem 30 anos, é extremamente reservada e trabalha numa indústria de embalagens plásticas onde não se relaciona com ninguém. Depois de seu chefe insistir muito ela vai passar férias num modesto povoado costeiro, em frente a uma plataforma petrolífera. Lá, hospedada em pequeno hotel, toma conhecimento de um grave acidente na plataforma que a faz lembrar-se que é (já foi) enfermeira. Contrariando sua introversão, apresenta-se para cuidar de um acidentado Josef (Tim Robbins), que, devido à gravidade de seus ferimentos, não pode ser removido e está temporariamente privado da visão. Na plataforma, agora semi desativada por causa do acidente, existe um mini cosmo formado por vários homens, cada um com uma personalidade marcante.

Não é preciso lembrar que num espaço limitado como a plataforma, não há como esperar muito movimento, muita ação, portanto, o desenrolar do enredo fica por conta do jeitão com o qual cada ator conduz seu personagem. Hannah, ao desembarcar do helicóptero que a transportou, tem um brevíssimo encontro com médico que até então cuidou do paciente Josef, já que o médico deixa a plataforma no mesmo helicóptero que a trouxe. Neste encontro vemos o primeiro laivo da profunda dor que vai pela alma de Hannah. Ao iniciar os cuidados ao paciente, nota-se que ambos têm cicatrizes na alma, e ele, muito mais falante, tenta ser galante tenta um aproximação com a enfermeira, embora esta, no princípio, se recuse a responder qualquer pergunta pessoal. Parece um duelo em que Josef quer saber tudo dela, enquanto ela nada responde, se limita a ações puramente profissionais. Hannah descobre no seu quarto o telefone celular onde tem uma mensagem de uma mulher que está lendo “Confissões de uma freira portuguesa”, e que se diz apaixonada por Josef que lhe deu o livro.

Os dias passam, outros trabalhadores da plataforma mostram suas personalidades, o biólogo, o cozinheiro, o chefe, o zelador, o que cuida das máquinas, mas, o que conta é que Hannah vai rompendo o silêncio aos poucos, vai abrindo seu passado com pequenos gestos, monossílabos e atos os quais não passam despercebidos pelos outros, principalmente Josef, que também mostra que os esqueletos no seu armário o incomodam. As coisas vão se encaixando, de modo que ambos se vêem confessando suas dores e seus pesares, o passado que os acompanha é pesado e eles acabam, finalmente, abrindo-se um ao outro. Desnecessário dizer que encontram-se nas suas angústias e fazem uma catarse que os redime. Só que Hannah se recusa a assumir que gosta de Josef e, ao fim do tratamento, este é removido para um hospital e Hannah volta à sua vidinha insípida na fábrica.

Na verdade, o filme não é uma história de amor, é uma história de vidas despedaçadas por catástrofes (no caso de Hannah, guerra) causadas pelo próprio homem, e egoísmos que não levam conta o quanto podem prejudicar o outro, aquele que por estar ao lado não percebe o quanto um amigo pode ser falso. O fim da história cai no lugar comum que todos esperam e nada acrescenta à qualidade do roteiro e montagem excepcionais. É um ótimo filme. JAIR, Floripa, 20/1110.