quinta-feira, 1 de julho de 2010

Os lemingues e o México


Lembro-me que, quando criança, uma das histórias que mais achei interessante foi a dos lemingues. O lemingue é um roedor parecido com o porquinho-da-índia que vive na Escandinávia e que, de tempo em tempos, por uma razão ainda não explicada, desloca-se em massa numa migração amoque que leva grande quantidade deles à morte. Como as costas dos países nórdicos, Noruega, Finlândia, Suécia e uma parte da Rússia, são caracterizadas pela existência de fiordes, formações que determinam barrancos abruptos no encontro da terra com o mar, os lemingues que chegam aos fiordes normalmente caem das pirambeiras e morrem afogados.
Muitas são as teorias que tentam explicar porque os lemingues se comportam dessa maneira “suicida”. Alguns cientistas acham que uma superpopulação e escassez de alimentos podem ser a causa, contudo, há escassez sazonal de alimentos anualmente e os lemingues procriam menos nessas ocasiões, mas não saem feitos loucos a procura de víveres que eles sabem que não existem. Essa teoria não é aceita pela maioria dos estudiosos, há uma explicação que atende melhor o que acontece.
A migração não parece ter peridiocidade regular, acontece a cada dez, doze e até vinte anos. Quando das migrações, normalmente há muito alimento disponível e os bichos estão saudáveis e se reproduziram em abundância. Então eles saem em multidões para os lados donde, há milhões de anos, havia terra e hoje só existe mar. Houve um aumento do nível das águas a cerca de trinta milhões de anos, a as terras a oeste ficaram submersas. O que se deduz é que os animais migram para essas terras agora inexistentes, terras que seus ancestrais ocupavam em tempos remotos. Parece que existe em seus genes uma mensagem específica que diz, vá para o oeste lá tem espaço para a expansão populacional e comida de montão. Os bichos vão para o oeste e muitos acabam morrendo.
Como escrevi em texto anterior, o México perdeu mais da metade de seu território pelas anexações que os EUA, fizeram em decorrência da guerra de 1846 a 1848 e por espoliação pura e simples mesmo. Grande parte do que hoje é o sul do irmão do norte já foi o México. Os mexicanos talvez não saibam, mas o comportamento de muitos tem semelhança com o dos lemingues. Eles vão para o norte, direção de terras que antes eram suas, e adentram o EUA obedecendo um impulso atávico gravado em suas memórias sociais. Eles estão apenas fazendo o que fariam a duzentos anos, deslocando-se para terras mexicanas, nada mais.
Lemingues e mexicanos migrantes não partilham uma herança genética comum que determina suas vocações a deslocamentos; mexicanos não estão programados geneticamente a ocupar espaços “seus” melhores em certas épocas; o que eles fazem é acreditar que se deslocando para o norte encontrarão melhores oportunidades de trabalho e uma vida mais fácil. O que mexicanos e lemingues partilham é a incerteza; a possibilidade de, num outro lugar encontrarem um Éden; e, mais ainda, ambos quase sempre se dão mal. O lemingues pelos despenhadeiros mortais a sua frente, e os mexicanos pela ação enérgica do ICE (Immigration and Customs Enforcement) agência de investigação do Departamento de Segurança americano. Formado em 2003, a missão do ICE é proteger a segurança do povo americano e o país por vigilância da imigração ilegal nas fronteiras, quase sempre fronteiras mexicanas.
Assim, os lemingues mexicanos, qualquer que seja a época estarão tentando migrar para terras mexicanas e, sempre que conseguem, estimulam outros cidadãos lemingues tentarem a sorte também. Estados sulinos americanos, um tanto desérticos, um tanto possuidores de reservas petrolíferas e, de resto, desenvolvidos como os demais, atraem os mexicanos pobres e, de certa maneira, os acolhem, a composição étnica desses estados comprova isso. Talvez um terço da população desses estados seja composta de mexicanos.
Se os EUA mantiverem a política de vistas grossas quando se trata de ilegais já estabelecidos no seu território, os lemingues mexicanos estarão reconquistando uma terra que já foi sua e onde eles merecem viver. JAIR, Floripa, 01/07/10.

2 comentários:

Carlos disse...

Gostei da conexão lemingues mexicanos. Abraços, Carlos.

Anônimo disse...

Mucho bom Abração
Fabio