quarta-feira, 25 de março de 2009

ABORÍGINES


No post anterior, “TERRAE AUSTRALIS” intencionei mostrar alguma coisa daquele país e, en passant, dei uma pincelada na existência dos aborígines, nome como são conhecidos os nativos australianos. Para começar vamos referir ao evento do “descobrimento”, palavra usual com a qual os navegadores costumam nomear a primeira chegada em uma terra antes desconhecida por eles. O descobridor europeu oficial da Austrália foi o Capitão James Cook, que reivindicou o vasto continente para a coroa do Reino Unido no dia 21 de Agosto de 1770 ao qual chamou Nova Gales do Sul. Entretanto, mesmo desconsiderando a colonização aborígine acontecida há dezenas de milhares de anos, a “descoberta” do Capitão Cook foi apenas uma das chegadas àquele continente, porquanto navegadores portugueses, espanhóis e holandeses em datas anteriores haviam triscado suas bordas sem desembarcarem, porque a terra era muito inóspita e muito longínqua, não valia à pena nem desembarcar quanto menos colonizá-la. Como os demais continentes “descobertos” pelos europeus, a Austrália também não era uma terra vazia de gente, existia um número bastante expressivo (cerca de 300 mil) de nativos embora estes fossem considerados, pelos descobridores, uma raça em extinção, chamando-os de remanescentes do Neolítico, numa evidente demonstração de desprezo e suposta superioridade dos brancos descobridores, frente a esses "primatas". Começo nada auspicioso para aquele povo que havia sobrevivido por cerca de quatrocentos séculos e desenvolvido uma cultura própria a despeito das condições adversas extremas das terras australianas. Na época da chegada dos ingleses o povo indígena estava dividido em 500 grupos, vivendo em bandos como caçadores-coletores e falando 200 tipos de dialetos diferentes. Não detinham conhecimento para confeccionar cerâmica, arcos e flechas, casas ou abrigos elaborados, objetos simples de madeira ou armas, a não ser o bumerangue que era usado principalmente na caça aos cangurus, e o didgeridoo instrumento musical feito de galho oco e que produz um som primevo e único, o qual remete à natureza, ao voo dos pássaros, ao vento e aos ruídos dos insetos e outros animais. Os habitantes originais daquele continente eram tão desprezados pelos europeus que a Constituição do país fazia apenas duas referências a eles: a que os excluía do censo e a que os deixava sob poder dos estados e não do Governo Federal. Visível aí o raciocínio deturpado do legislador, não eram GENTE então não precisavam ser contados como tal; não eram IMPORTANTES, logo, o que os estados decidissem ou não a respeito deles estava correto, não havia necessidade da União defendê-los ou tutorá-los. Diante dessa omissão do estado, os nativos eram caçados a tiros como esporte de fim-de-semana dos colonizadores. Em 1940, usando a lógica: “o mais forte sempre tem razão”, os aborígines foram catequizados e integrados à vida rural e urbana como trabalhadores braçais mal pagos e sem direitos trabalhistas. As crianças eram tiradas dos pais e dadas a famílias brancas com o intuito de promover uma melhor interação delas com a sociedade dita “moderna” e de usá-las com empregados não remunerados (escravos) nos serviços caseiros mais sujos e degradantes. Toda uma geração de nativos se viu forçada a uma convivência não desejada e perdeu sua identidade aborígine sem conseguir outra em troca, já que os brancos continuavam a considerá-los inferiores raciais. A partir de 1967 o cenário da vida do povo aborígine começou a melhorar um pouquinho só. A população australiana votou pela inclusão dos aborígines no censo. Aleluia! Finalmente são GENTE! Agora só lhes falta serem reconhecidos como cidadãos. Em 1969 o geólogo australiano Jim Bowler descobriu o “Mungo Man”, fóssil de um aborígine que teria vivido há 40 mil anos atrás, o que comprovou os habitantes nativos como o povo mais antigo a seguir uma cultura no mundo. Suas línguas e dialetos seriam os mais antigos do planeta, assim como seu sistema de crenças. Que crenças seriam essas? “O Sonhar”, ou “The Dreaming” engloba a base da cultura, filosofia, folclore, leis, rituais e lendas do povo aborígine. Para eles, essa filosofia é uma espécie de bíblia vocal que explica a criação do Universo. Em 1983 o Parlamento australiano reconheceu-lhes o direito à terra já que, para eles esta é sagrada, em conseqüência passaram a receber indenização em forma de pagamentos semanais como uma espécie de compensação pelo uso que os brancos fazem de sua propriedade. No entanto, apesar de já integrados e tendo suas crenças e direitos reconhecidos, os aborígines ainda eram considerados um povo em vias de extinção. Só que para um povo à beira da extinção, os aborígines resistem muito. Continuam rebeldes, são contrários a sistemas hierárquicos e segundo as autoridades australianas, é difícil governá-los. Destituídos de seus valores culturais, afastados de seu modus vivendi e não integrados cultural, econômica e socialmente ao mundo branco que os cerca, muitos acabam se rendendo ao alcoolismo e possuem qualidade de vida muito inferior ao restante da população australiana. A expectativa de vida do povo aborígine chega a ser 20 anos menos que a dos colonizadores brancos. A exemplo do que ocorre com todos os povos subjugados pelo horror da colonização, aliado ao desprezo que os donos do poder dedicam aos povos submetidos ao seu jugo, muitos aborígines são hoje mera atração turística nas ruas de grandes cidades, tocando didgeridoo ou deixando-se fotografar a troco de “golden coins”, moedas de um e dois dólares australianos. O único consolo que ocorre a quem, como eu, torce pela perpetuação de um povo tão tripudiado e sofrido quanto pertinaz e interessante, é saber que no caso de hecatombe nuclear ou desastre de proporções tais que todas as fontes de alimentos desapareçam e a civilização venha a ser exterminada pela fome, os aborígines vão continuar vivos e saudáveis, provavelmente tornar-se-ão os donos do Planeta. JAIR, Floripa, 25/03/09.

2 comentários:

Anônimo disse...

Caro Batraquio, Gostei demais, pois eu acredito que o que foi feito na nossoa querida Australia, tambem foi e é feito na nossa querida Terra de Pindorama, desde sua invasão, pelos portugueses, que os livros isistem em chamar de descobrimento.
abração
CB Fábio

Leonel disse...

É uma questão difícil ! Os navegadores dos grandes impérios europeus investiam muito nessa busca por novas terras, novas fontes de riquezas, e não estava nos planos deles dividir o que encontravam com os habitantes originais das terras "descobertas". Ainda tinha a questão religiosa, usada frequentemente como desculpa. Aos "gentios" eram dadas duas alternativas: a primeira era a "conversão", ou seja, a aceitação da religião dos conquistadores e do consequente papel secundário atribuído aos nativos, como a servidão ou a escravidão (a bíblia só se referia ao povo de Israel e seus descendentes, não aos negros, aborígenes e índios!). A segunda era a resistência e a aniquilação diante de um inimigo mais bem armado, dotado de tecnologia superior. Os contatos de povos nativos com conquistadores europeus tiveram um desenlace quase que padrão: um misto de aniquilação com submissão ! Talvez por este motivo, as grandes potências têm tanto medo de contatos com extraterrestres, supostamente possuidores de tecnologias mais avançadas!