domingo, 22 de agosto de 2010

Energia


Qual é a marca da civilização? O que define que os povos, as nações, os países, tornaram-se civilizados? Essas questões singelas, de respostas também bastante simples, encerram o que hoje é o maior desafio da humanidade: continuar “civilizada”. Enquanto vagava como caçador-coletor, o homem não era um grande consumidor das energias naturais a seu dispor, abrigava-se em cavernas, choupanas improvisadas, comia carne crua ou assada quando houvesse meios para isso e, na maior parte das vezes, alimentava-se de frutos maduros onde os encontrasse e vestia-se de peles de animais ou vivia nu. Em matéria de consumo de energia o ser humano era minimalista, quase nada exigia do ambiente que o cercava e não desfrutava de uma organização sofisticada que lhe impusesse encontrar meios de obter energia para sua vida simples. Desde que o Homo sapiens agregou-se em comunidades semi fixas onde passou a praticar agricultura e domesticação de animais para sua sobrevivência e conforto, começou o que podemos chamar do ciclo da energia. Essa é a marca da civilização.

Já nos aglomerados familiares, tribais e de clãs iniciais, o homem se viu frente à necessidade de obter energia para seu modus vivendi que, agora, postulava novos níveis de consumo, tratava-se de comunidades com algum nível de sofisticação. O fogo de lenha, inicialmente, atendia os reclamos de cozimento da caça e pesca e a necessidade aquecimento de seus abrigos. Contudo, até pela quantidade de pessoas que conviviam, apareciam novas demandas e, em consequência, artesanato, confecção de utensílios cerâmicos e, mais tarde, fabrico de armas metálicas exigiam novas fontes de calor. O carvão, pela facilidade do uso in natura e pela abundância, foi a escolha compulsória. O carvão foi e ainda é, a fonte de energia não renovável mais utilizada ao longo da história da civilização.

Com o crescimento da população mundial, com a complexidade das novas conquistas tecnológicas, com a demanda cada vez maior por fontes energéticas, o petróleo entrou na dança. No início, o petróleo, depois do refino para se obter um tipo de querosene, era usado para iluminação pública e doméstica, e aquecimento dos lares em aparelhos rudimentares. Com o aparecimento do automóvel, não é necessário dizer, o petróleo tornou-se uma espécie de deus da vida civilizada. Não é estultice afirmar que quase toda estrutura de nossa sociedade dita civilizada está calcada no consumo do petróleo. Ainda que as fontes hidráulicas, as quais nos fornecem energia elétrica e até outras fontes menos expressivas como as usinas atômicas, sejam, também, importantes para o suporte da demanda do Homo sapiens, o petróleo é a prima donna do elenco energético do Planeta.

Pois é, depois de muito tempo de consumo desenfreado, depois que o petróleo se tornou, muito além de sua utilização normal como fonte de energia, um fator político que desencadeia guerras, que constrói e destrói economias, o homem, finalmente se dá conta que ele é não renovável, que ele um dia vai acabar, que usar como se usa o petróleo é uma viagem sem volta. E agora José? Vamos continuar consumindo cegamente esse produto para manter nossos níveis de civilização e deixar a conta para nossos descendentes? Ou vamos repensar o que chamamos de civilização, e retornar a um nível racional de consumo energético de modo a que o próprio Planeta se encarregue de repor o que consumimos? Veja bem, não se trata apenas de descobrir e usar outras fontes, as chamadas fontes de energia alternativa como solar, biomassa, eólica, geotérmica etc. Não é apenas isso. Trata-se de repensar a civilização, trata-se de olhar ao redor e perguntar: Será que para ser feliz eu preciso de tudo isso? Será que apenas um carro por família não é suficiente? Por que devo ter sempre mais? A felicidade é, realmente, ter ao invés de ser? Vale a pena queimar todas as fontes de energia do Planeta para, supostamente, atingir um nível de “civilização” discutível e que não pode ser mantido ad infinitum? Viemos aqui (ao Planeta) apenas para destruí-lo? Somos agentes finais de um ciclo de extinções que, de tempos em tempos, passa nosso Planeta?

Então, a energia que consumimos para manter a civilização é aquela que o Planeta “fabrica” pela transformação do calor que recebe do sol em energia biológica, a qual, depois de outras mudanças químicas surge como lenha, petróleo, carvão etc. A energia geotérmica, embora não relacionada diretamente com a luz solar atual, é um resquício da formação do Planeta e, de certa forma, pela quantidade existente, é virtualmente inesgotável. Mesmo que o homem descubra meios seguros e eficazes de transformá-la em energia aproveitável, deverá durar enquanto o Planeta existir. Portanto, não está em questão esta fonte, ela existe e, certamente, será aproveitada num futuro próximo. A questão é outra, mantidos os níveis atuais de aumento de consumo, não haverá tempo para desenvolver nem encontrar fontes energéticas suficientes antes do colapso da civilização. Estamos numa corrida amoque rumo à extinção exclusivamente por nossa incúria. Não temos consciência que a energia que consumimos e que é a marca de nossa civilização será a marca de nossa extinção também. A única maneira de escaparmos dessa armadilha que armamos será baixar nosso consumo para níveis que tornem viável a reposição do que consumimos. Essa é uma decisão dificílima que traz a extinção da civilização como contrapartida, não há alternativa. Se o homem é o ser inteligente que suspeitamos que seja, está na hora de encarar o desafio. Gaia agradece. JAIR, Floripa, 22/08/10.

5 comentários:

Daniela disse...

Falta consciência para entender que estamos destruindo nosso habitat, e que ele não dá conta do nosso consumo excessivo! Como nossas gerações vão sobreviver? A civilização se auto-extinguindo...

R. R. Barcellos disse...

- Nada vai resolver se a população mundial continuar crescendo nesse ritmo alucinado. Como não podemos distribuir um "brochante" a nível planetário, a estratégia mais viável é reduzir a taxa de nascimentos através do único instrumento "civilizado" adequado: levar às prolíficas comunidades primitivas as bênçãos do progresso (parece que os índices de qualidade de vida são inversamente proporcionais às taxas de nascimentos). Se isso não funcionar, é melhor largar mão... a natureza saberá se defender! Mas a que preço?

Amélia Ribeiro disse...

Olá Jair,

é, temo que nos demos conta demasiado tarde do mal que fazemos a nós mesmos..., o preço a pagar pode ser muito alto!

Um beijo e bom domingo.

Amélia Ribeiro disse...

Amigo Jair,

queria parabenizar-te pelo livro.

Gostaria de o ver, pelo menos a portada, na lateral do teu blog.

Um beijo e que pena que estou tão longe para poder usufruir dele...

Leonel disse...

Infelizmente, você acertou: a política e os interesses corporativos estão retardando a adoção de medidas mais efetivas para substituir o petróleo.
E, se não quisermos mesmo que tudo vire um caos, as cidades do futuro terão que possuir uma opção mais viável e prática de transporte coletivo que permita realmente prescindir dos automóveis individuais, pois, mesmo que sejam movidos por energia não-poluente, continuarão a atravancar as ruas e causar "stress".
Quanto ao controle de natalidade, nem vou falar, pois não quero ser taxado de nazista...