Desde sempre, mas especialmente desde o século passado, somos bombardeados com notícias sobre as guerras do Oriente Médio. Árabes e judeus, numa incruenta disputa, arreganham os dentes ou entram em batalhas abertas por um pedaço de terra que, sob quase todos os aspectos, não é atraente, não possui riquezas naturais e não parece ser estratégico do ponto de vista militar.
O fato histórico concreto é que dentre as tribos que conviviam, mais ou menos pacificamente, naquele pedaço do mundo quatro mil anos atrás, algumas resolveram adotar o monoteísmo como conduta religiosa, afrontando diretamente a maioria que cultuava deuses domésticos que representavam seus ancestrais. Da dissidência religiosa nasceu o antagonismo que, de tempos em tempos, gerava rusgas tribais que, eventualmente, se transformavam em contendas limitadas, no mais, a vida seguia em frente.
O “povo diferente” que seguia um Deus invisível foi aos poucos se isolando e, em conseqüência, cada vez mais, adotando costumes e hábitos diferenciados, já que sua religião era “de tempo integral e dedicação exclusiva”, não se limitando a rezas e rituais em oratórios domésticos em horas aprazadas. O isolamento religioso não impedia que houvesse um constante intercâmbio comercial e social entre as tribos de monoteístas e politeístas, elas compartilhavam seus negócios, casamentos, festas, atividades e idioma (aramaico), não havia ainda árabes ou judeus, ou sionistas, ou islamitas, muito menos cristãos.
Durante séculos de guerras, invasões, êxodos, migrações limitadas e evolução de hábitos religiosos o “povo de um Deus só” continuou coeso nas suas convicções e unido socialmente, o politeísmo esboroou. Com o nascimento de Cristo, judeu da Galiléia, alguns monoteístas elegeram-no “enviado de Deus”, outros não. Nova dissidência, agora entre judeus que acreditavam no Messias e judeus que não acreditavam; surgia nova religião, o cristianismo. Para azar de todos, cristãos e judeus, os romanos invadiram a região na década de setenta da nossa era e massacraram os moradores de Jerusalém, especialmente os judeus, que eram menos submissos. Era o ano de 73, nascia a diáspora.
Os judeus dispersaram-se pelo Planeta, mas, quase nunca, foram “integrados” às nações e povos que os acolheram, em alguns casos foram “assimilados” sem, contudo, tornarem-se cidadãos de plenos direitos. Essa anomalia civil crônica, além de perseguições e discriminações, oficiais ou não de todo tipo, fizeram com que uma grande parte desse povo visse na volta a casa sua opção de tranquilidade e plena realização de seus sonhos de cidadania. A volta a Israel – Aliá, substantivo hebraico que significa subida - tornou-se o que se convencionou chamar de sionismo, em referência ao monte Sião ou Zion situado nos arredores de Jerusalém.
Depois do genocídio perpetrado pelos alemães e seus aliados na segunda guerra mundial, tornou-se imperativo que as Nações Unidas permitissem que os judeus mais errantes que nunca, se reunissem em sua terra original e formassem uma nação. Israel nasceu por decreto da ONU, e, em 1948, o “povo do livro” teve, finalmente, um lugar seu onde podia chamar de lar.
Mas, muito antes disso, há uma história que gostaria de contar para lembrar que a paz é possível por simples vontade de cidadãos. Em 1845, o novo cônsul inglês em Jerusalém, James Finn, e sua esposa, Elisabeth, apresentaram suas credenciais às autoridades turcas naquela cidade, já que a Palestina como era chamada a área, pertencia ao império otomano. O cônsul era católico falava hebraico e era filiado à Fraternidade Londrina para Propagação do Cristianismo entre Judeus. Finn acreditava que o retorno dos Judeus a sua pátria de origem aceleraria a redenção do mundo; acreditava que lhes dando condição de trabalho dignas eles conseguiriam uma vida melhor. Ele se propôs a ajudar os judeus pobres porque entendia que se eles tivessem renda decente, mais se fixariam ao local em que viviam e tenderiam a criar uma nação. Assim, em 1853, comprou uma gleba de terra abandonada e árida de quatro hectares onde construiu sua linda morada. Era um pedaço de terra que ninguém queria, mas que o cônsul resolveu transformar numa fazenda produtiva a qual deu o nome de Kerem Avraham (Vinha de Abraão). Nos arredores da casa eles construíram o empreendimento agrícola, as oficinas e as benfeitorias. Atrás da casa, no pátio protegido por um muro, cavaram-se poços e foram construídos estábulos, curral, um celeiro depósitos, uma prensa para uvas e uma prensa para azeitonas.
A Colônia Industrial empregava cerca de duzentos judeus pobres na fazenda dos Finn em trabalhos tais como retirar pedras das encostas, construir cercas, plantar árvores frutíferas, trabalhar na horta, no pomar e também numa pequena pedreira e na construção civil. Com o passar dos anos e depois da morte do cônsul, sua viúva construiu uma fábrica de sabão, na qual também empregava trabalhadores judeus.
Quase na mesma época, lindeiro à propriedade dos Finn, o missionário protestante alemão Johann Ludwig Schneller, construiu um orfanato para árabes cristãos refugiados dos conflitos entre cristãos e drusos no Líbano. Ele tinha como objetivo preparar os órfãos para uma vida produtiva que pudesse lhes proporcionar meios de traduzir o trabalho em qualidade de vida. Finn e Schneller, cada uma a sua maneira, ambos cristãos fervorosos, e a miséria, o sofrimento e o desamparo de árabes e judeus da Terra Santa lhes tocavam o coração. Ambos acreditavam que na medida em que os habitantes se preparassem para uma vida produtiva, uma vida de trabalho, o Oriente Médio estaria a salvo das garras do desespero, da degeneração, da miséria e da indiferença e, podemos dizer, estariam motivados a viver em paz. Talvez ambos acreditassem, cada um a seu modo, que sua generosidade iluminasse judeus e muçulmanos de modo a encaminhá-los ao cristianismo e a paz entre eles.
Que se pode inferir desses fatos? Vejamos, dois cristãos europeus que poderíamos julgar indiferentes ao que acontecia num local muito distante daqueles que viviam; onde as culturas envolvidas nada lhes dizem, dedicam-se a projetos visando alcançar a paz sem, aparentemente, outro objetivo que não o trabalho produtivo. Registre-se que nunca houve qualquer atrito entre as comunidades dos dois projetos. Finn e Schneller sequer foram indicados para o prêmio Nobel da paz como o foi Nixon, por exemplo. JAIR, Floripa, 10/08/11.
O fato histórico concreto é que dentre as tribos que conviviam, mais ou menos pacificamente, naquele pedaço do mundo quatro mil anos atrás, algumas resolveram adotar o monoteísmo como conduta religiosa, afrontando diretamente a maioria que cultuava deuses domésticos que representavam seus ancestrais. Da dissidência religiosa nasceu o antagonismo que, de tempos em tempos, gerava rusgas tribais que, eventualmente, se transformavam em contendas limitadas, no mais, a vida seguia em frente.
O “povo diferente” que seguia um Deus invisível foi aos poucos se isolando e, em conseqüência, cada vez mais, adotando costumes e hábitos diferenciados, já que sua religião era “de tempo integral e dedicação exclusiva”, não se limitando a rezas e rituais em oratórios domésticos em horas aprazadas. O isolamento religioso não impedia que houvesse um constante intercâmbio comercial e social entre as tribos de monoteístas e politeístas, elas compartilhavam seus negócios, casamentos, festas, atividades e idioma (aramaico), não havia ainda árabes ou judeus, ou sionistas, ou islamitas, muito menos cristãos.
Durante séculos de guerras, invasões, êxodos, migrações limitadas e evolução de hábitos religiosos o “povo de um Deus só” continuou coeso nas suas convicções e unido socialmente, o politeísmo esboroou. Com o nascimento de Cristo, judeu da Galiléia, alguns monoteístas elegeram-no “enviado de Deus”, outros não. Nova dissidência, agora entre judeus que acreditavam no Messias e judeus que não acreditavam; surgia nova religião, o cristianismo. Para azar de todos, cristãos e judeus, os romanos invadiram a região na década de setenta da nossa era e massacraram os moradores de Jerusalém, especialmente os judeus, que eram menos submissos. Era o ano de 73, nascia a diáspora.
Os judeus dispersaram-se pelo Planeta, mas, quase nunca, foram “integrados” às nações e povos que os acolheram, em alguns casos foram “assimilados” sem, contudo, tornarem-se cidadãos de plenos direitos. Essa anomalia civil crônica, além de perseguições e discriminações, oficiais ou não de todo tipo, fizeram com que uma grande parte desse povo visse na volta a casa sua opção de tranquilidade e plena realização de seus sonhos de cidadania. A volta a Israel – Aliá, substantivo hebraico que significa subida - tornou-se o que se convencionou chamar de sionismo, em referência ao monte Sião ou Zion situado nos arredores de Jerusalém.
Depois do genocídio perpetrado pelos alemães e seus aliados na segunda guerra mundial, tornou-se imperativo que as Nações Unidas permitissem que os judeus mais errantes que nunca, se reunissem em sua terra original e formassem uma nação. Israel nasceu por decreto da ONU, e, em 1948, o “povo do livro” teve, finalmente, um lugar seu onde podia chamar de lar.
Mas, muito antes disso, há uma história que gostaria de contar para lembrar que a paz é possível por simples vontade de cidadãos. Em 1845, o novo cônsul inglês em Jerusalém, James Finn, e sua esposa, Elisabeth, apresentaram suas credenciais às autoridades turcas naquela cidade, já que a Palestina como era chamada a área, pertencia ao império otomano. O cônsul era católico falava hebraico e era filiado à Fraternidade Londrina para Propagação do Cristianismo entre Judeus. Finn acreditava que o retorno dos Judeus a sua pátria de origem aceleraria a redenção do mundo; acreditava que lhes dando condição de trabalho dignas eles conseguiriam uma vida melhor. Ele se propôs a ajudar os judeus pobres porque entendia que se eles tivessem renda decente, mais se fixariam ao local em que viviam e tenderiam a criar uma nação. Assim, em 1853, comprou uma gleba de terra abandonada e árida de quatro hectares onde construiu sua linda morada. Era um pedaço de terra que ninguém queria, mas que o cônsul resolveu transformar numa fazenda produtiva a qual deu o nome de Kerem Avraham (Vinha de Abraão). Nos arredores da casa eles construíram o empreendimento agrícola, as oficinas e as benfeitorias. Atrás da casa, no pátio protegido por um muro, cavaram-se poços e foram construídos estábulos, curral, um celeiro depósitos, uma prensa para uvas e uma prensa para azeitonas.
A Colônia Industrial empregava cerca de duzentos judeus pobres na fazenda dos Finn em trabalhos tais como retirar pedras das encostas, construir cercas, plantar árvores frutíferas, trabalhar na horta, no pomar e também numa pequena pedreira e na construção civil. Com o passar dos anos e depois da morte do cônsul, sua viúva construiu uma fábrica de sabão, na qual também empregava trabalhadores judeus.
Quase na mesma época, lindeiro à propriedade dos Finn, o missionário protestante alemão Johann Ludwig Schneller, construiu um orfanato para árabes cristãos refugiados dos conflitos entre cristãos e drusos no Líbano. Ele tinha como objetivo preparar os órfãos para uma vida produtiva que pudesse lhes proporcionar meios de traduzir o trabalho em qualidade de vida. Finn e Schneller, cada uma a sua maneira, ambos cristãos fervorosos, e a miséria, o sofrimento e o desamparo de árabes e judeus da Terra Santa lhes tocavam o coração. Ambos acreditavam que na medida em que os habitantes se preparassem para uma vida produtiva, uma vida de trabalho, o Oriente Médio estaria a salvo das garras do desespero, da degeneração, da miséria e da indiferença e, podemos dizer, estariam motivados a viver em paz. Talvez ambos acreditassem, cada um a seu modo, que sua generosidade iluminasse judeus e muçulmanos de modo a encaminhá-los ao cristianismo e a paz entre eles.
Que se pode inferir desses fatos? Vejamos, dois cristãos europeus que poderíamos julgar indiferentes ao que acontecia num local muito distante daqueles que viviam; onde as culturas envolvidas nada lhes dizem, dedicam-se a projetos visando alcançar a paz sem, aparentemente, outro objetivo que não o trabalho produtivo. Registre-se que nunca houve qualquer atrito entre as comunidades dos dois projetos. Finn e Schneller sequer foram indicados para o prêmio Nobel da paz como o foi Nixon, por exemplo. JAIR, Floripa, 10/08/11.
7 comentários:
O instrumento da Guerra é a força, o da Paz é o trabalho. Quanto ao Nobel, eu já abri e fechei aspas, mas ainda não sei o que botar no meio.
Abraços.
Enciclopédico amigo, seu texto, como de costume é muito bom e elucidativo. Sou muito ligado à música e enquanto lia seus dizeres lembrei-me de uma canção de Gil.
Ouça-a também...
http://www.youtube.com/watch?v=LlQLV2oUjCg&feature=related
Muito interessante e informativo... Penso que os conflitos no Oriente Médio são mais 'estimulados' do que imaginamos, pelas grandes potencias mundias a fim de garantir seus interesses na região...
Parabéns pela ótima postagem!
Abraços...
A paz é um sonho desejável pela maioria, sou um destes, mas os caminhos que levam a uma completa paz passam por uma questionável guerra de interesses...
Abraços!
Jair:
Desde os tempos mais remotos a humanidade esteve em conflitos e assim continuará. Quando se lida com humanos, a paz é escassa. Muitos se esforçam para manter uma fictícia paz enquanto outros não estão nem aí, estão em guerra constante consigo mesmo. E estando consigo, pobre mundo!
O ser humano precisaria mudar, buscar diferenças e verdades. Creio que os resultados de manifestos coletivos começam na individualidade de nossos atos; estão nas mutações dos nossos sentimentos. E nisso gostaria de acreditar. Mas nunca acontecerá, é utopia.
Você fez uma abordagem geral do real, e mostrou a realidade verdadeira desde sempre.
Muito interessante.
Abraços
Tais Luso
Muito estimado Jair,
que maravilha os fatos singulares que nos premias nesta edição do blogue, que tem como título a palavra que deveria ser anel natural dos humanos: PAZ.
Todavia nós que estamos na grandes religiões abraâmicas (judaísmo, cristianismo, islamismos) temos num texto fundante: Quem é o primogênito de Abraão (Ismael ou Isaac) aquém o Deus invisível que recordas tudo prometeu? A rixa entre os pastores de Ismael e de Isaac (ou antes a briga entre os dois, que leva Abraão a fazer que Agar e Ismael sejam levados para longe) parece ser (metaforicamente) a semente de toda esta discórdia.
Obrigado por nos ilustrares hoje, como sempre
attico chassot
Já vi trabalho de pastorais da terra semelhante ao que narrou,com bóias-frias,os sem terras...Neste trabalho aconteciam conflitos motivados pelo poder, imagine, briga para ser o pastor evangélico,num assentamento rural nas imediações de Palmeira,nos Campos Gerais...No geral, os resultados foram muito produtivos.Sempre acreditei que é por este caminho, o do trabalho, que dignificará o homem,investir no seu talento... A paz será possível se cada cidadão despertar a sua consciência, nos moldes do AVATAR...Luci.
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