Se quisermos entender o universo que nos cerca, e do qual fazemos parte intrínseca, é necessário que olhemos em volta, é fundamental que olhemos com o olhar da mente aberta para o vasto panorama de sistemas que se interpõe e se cruzam de modo complexo onde as vidas dos seres mais insuspeitados se inter-relacionam. Sua arquitetura e conexões constituem uma unidade majestosa.
A matéria e a energia são somente aspectos diferentes da mesma realidade fundamental, mas em todas suas incontáveis manifestações obedecem às leis cósmicas inexoráveis, imutáveis e cartesianas. E mais, os efeitos dessas leis através da infinita variedade de materiais e energia geram uma unidade implícita e observável: o equilíbrio dinâmico das forças biológicas, mantidas em suas direções e fórmulas por restrições e imposições dos mais variados tipos. Ou seja, o que vale para a bactéria, vale para o homem, o que vale para a planta, vale para o animal, não há leis aplicáveis a uns e não a outros.
Há um sistema unificado e impositivo em todo o cosmo; e, no frigir dos ovos, tudo é energia. As grandes massas, vamos dizer assim, são os aglomerados galácticos; depois vêm as galáxias com seus sistemas solares; planetas e satélites compõe conjuntos menores; os reinos naturais, mineral, animal e vegetal vêm em seguida; tecidos, sistemas, órgãos, rochas, água, moléculas complexas e simples compostas de átomos seguem até o âmago das partículas elementares, prótons, elétrons, nêutrons e as demais. Sob todas as formas de matéria inerte e manifestações de vida, palpita a energia, se comportando de acordo com as leis da física e da química. Ainda que saibamos que tudo é energia, não deixa de nos maravilhar que esta se desdobra numa variedade incrível de coisas materiais, como também produz padrões de vida de uma complexidade ainda maior: Desde o suposto Big bang que a tudo deu início, até a minúscula célula individual e desde esta até suprema complexidade do cérebro dos humanos, em cujo interior bilhões de neurônios podem contar com algo em torno de 270.000 conexões diretas com seus vizinhos.
Dentro de nosso Planeta, as inter-relações entre as unidades viventes maiores e os minúsculos seres como as bactérias, constituem a própria essência da existência. Não há qualquer vida isolada, parafraseando o poeta John Donne eu diria: “Nenhum ser vivo é uma ilha”. E mais, toda e qualquer alteração, por mínima que seja em um ambiente, reflete no todo, o Efeito Borboleta não é só uma expressão linguística vazia. A origem da vida no nosso Planeta, como sabemos, vem do Sol, este emite luz e calor com uma generosidade descabida, ilimitada até. Contudo, sabemos que o produto final da energia doada pela nossa estrela particular, as folhas da plantas, os seres microscópicos como algas e bactérias e suas posições na cadeia alimentar que permitirão sistemas vivos mais complexos, não são ilimitados nem perenes. Se removermos as coberturas vegetais do solo fértil, este se transformaria num deserto; se destruirmos as florestas e submetermos os pastos a um pastoreio excessivo, as terras produtivas se extinguirão; se sobrecarregarmos as correntes naturais, os lagos e oceanos com esgotos e poluentes químicos, a vida aquática deixaria de existir com consequências inimagináveis.
Em virtude de existirem efetivamente milhares de caminhos para o ponto de “não retorno”, onde os efeitos sobre os biomas são irreversíveis; onde os ciclos de auto-regeneração, sobre os quais repousa toda a dinâmica da vida, rompem como um elo fraco da corrente, devemos observar que é nossa responsabilidade, como sócios “inteligentes” do Planeta, fazer tudo ao nosso alcance para minorar os efeitos deletérios de nossas ações sobre a natureza.
E isso nos conduz a uma reflexão decorrente. A íntima e inescapável inter-relação que existe entre os seres vivos envolve certa reciprocidade dinâmica, certa cumplicidade implícita. O enfraquecimento ou destruição dessa estabilidade libera as amarras que impedem a destruição da vida, com resultados terríveis. Os arranjos naturais dos ciclos de vida asseguram a seus “sócios” o alimento e as condições de reprodução que necessitam. A maioria desses arranjos exige que uns sejam alimentos de outros, a chamada cadeia alimentar. A introdução de espécies que não pertencem a esses sistemas, ou a alteração física ou química, em geral constituem o que de mais pernicioso pode acontecer. Na Austrália, a introdução do sapo cururu, oriundo do México, para comer as pragas que atacavam o canavial, constitui um exemplo basilar dessa “quebra de decoro” recorrente que o Homo sapiens pratica. Além de não comerem as pragas das canas, os sapos passaram a atacar a fauna local e estão desequilibrando a ecologia de forma incontrolável, se alimentam de ovos de pássaros, filhotes de cobras e lagartos, além de serem extremamente venenosos a ponto de matarem as cobras que por desventura abocanhem alguns deles. Introdução de ratos pelos navios, de gatos para dizimar os ratos, de coelhos e raposas para caça esportiva, de camelos para transporte nos desertos, tem sido uma dor de cabeça piramidal para os australianos. É bom que se diga que TODOS os mamíferos australianos são marsupiais, qualquer placentário que por lá se encontre é alienígena, até o famoso Dingo, o qual foi introduzido pelos aborígines cerca de vinte mil anos atrás. A Ilha da Páscoa é outro exemplo clamoroso da incúria humana. Depois de terem destruído todas as árvores os Rapa Nui desintegraram-se como povo, perderam sua coesão cultural, suas tradições e laços sociais, tudo que restou foram uns poucos indivíduos desnorteados e sem raízes. No Brasil, na ilha Fernão de Noronha onde foi introduzido o lagarto teiú, houve a extinção dos pássaros que lá nidificavam porque os lagartos comeram seus ovos, o equilíbrio ecológico se rompeu.
Então, para não dizer que nada fiz a respeito, fica meu grito no deserto: De um lado, a inteligência humana lhe faculta a capacidade de “domar” a natureza para seu beneficio, de outro, sua ganância cega queima as pontes que lhe permitiriam retornar a um lugar seguro antes da catástrofe, de modo que, se a humanidade tem planos para o futuro, terá que parar por dez segundos e repensar suas estratégias de sobrevivência. Disso dependerá se o Planeta do porvir será dominado por seres humanos ou se tornará um “Planeta dos macacos”. JAIR, Floripa, 06/12/10.
6 comentários:
Olá,
Sempre achei surpreendente o rearranjo da natureza. Assim como somos seres vivos com a capacidade maior de desenvolvimento intelectual (digo maior, pois por exemplo, as formigas ao se organizarem para buscar comida também são seres vivos desenvolvendo uma atividade), também somos seres com um poder maior de destruição.
Penso que depois da Revolução Industrial, a humanidade vem se transformando em PG e não mais em PA como antes. Agora com a era digital veremos um avanço muito mais rápido que antigamente. Vale também para o lado negativo, pois com tanta tecnologia e avanço, vai bastar uum estalar de dedos para que todos nós sejamos banidos como esta forma de vida. Acredito muito que o desenvolvimento da tecnologia irá nos proporcionar uma longevidade com melhor qualidade. Também seremos seres metade tecno, metade humano. Não me assusta o fato de no futuro poder ser considerada uma Cyborg. Outra coisa: espero ainda estar viva para andar de teletransporte. :-)
Beijos da nora,
Brilhante análise! Na minha opinião, quem programou esta coisa toda sabia o que estava fazendo. Agora, quando os bichinhos que andam sobre as patas traseiras se metem a querer modificar as coisas, dificilmente sabem lidar com as inúmeras variáveis envolvidas!
Daí as mancadas e suas consequências!
Os Rapa-Nui foram uma amostra de como um microcosmo foi afetado pelo mau uso dos recursos.
Em escala maior, o mesmo está sendo feito no planeta.
Ótimo alerta, Jair!
- Generosidade de sua parte chamar o Homem de "sócio inteligente do planeta"... pois esse sócio anda fazendo tanta besteira que é capaz de o acionista majoritário bani-lo das assembléias deliberativas, e até mesmo bloquear suas ações.
- Entre os inúmeros exemplos de biomas vítimas das besteiras desse sócio, a Austrália é sem dúvida o mais gritante. Lembro-me de ter lido sobre os problemas causados pela introdução de lebres, para que nobres ingleses pudessem desfrutar do nobre esporte da caça, e da dificuldade de conter a praga da figueira do inferna, cactácea importada para servir como cerca-viva.
- E vamos continuar metendo a boca na trombeta, amigão! Abraços.
Jair,
Você é um guerreiro que não descansa um minuto em defesa da natureza, e sempre coloca o dedo na ferida. Parabéns.
Gostei deste texto, elucidativo, coerente com as suas ideias e avisos que nós, homens, muitas vezes nos esquecemos de seguir, o que é uma pena.
Passei tambem para te desejar boas Festas de Natal e Ano Novo - que o mundo aprenda e entenda estas inter-relações que são necessárias manter para uma boa harmonia.
Beijos
Graça
A natureza tem uma estrutura feminina: não sabe se defender mas sabe se vingar como ninguém,só quando a última árvore for derrubada, o último peixe for morto e o último rio for poluído é que o homem perceberá que não pode comer dinheiro.
Parabéns Jair
Abraços
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