Mais que massa de ar em movimento é transparência que se desloca, é espírito invisível que se move pressuroso. É fluido etéreo que passeia alegre sobre campinas verdes, escala montanhas, levanta poeira e varre desertos. Enfuna a vela do barco inocente que singra as águas mansas da lagoa azul; sustenta ave de papel colorido do garoto caçador de pipas; refresca o camponês solitário, concentrado no amanho da terra; cria ondulações regulares no pasto do gado preguiçoso. É imanente com traços de eterno; não pede passagem nem se desculpa; ultrapassa artefatos confeccionados pelo homem e tem personalidade (ou seria ventalidade?). Seguro de si, estável e presunçoso não respeita obstruções edificadas em seu caminho, a tudo acomete sem indulgência ou temor. Se condições de umidade, pressão e temperatura lhe forem favoráveis, avoluma-se em massas compactas e espetaculares, as quais o homem nomeia furações, ciclones ou tufões, não importa. Colunas gigantescas e de extensões ciclópicas, deslocam-se com fúria avassaladora a centenas de quilômetros por hora erigindo, sobre a água, vagalhões mortais que danificam navios, afundam barcos mais frágeis e transformam o oceano de chumbo em cadeias de montanhas fluidas e fatais. Na terra seca, avança sem se deter carregando adiante pontes, casas, carros e objetos de fabricação humana; como catadupa infernal, despeja zilhões de galões mortais, num átimo, em espaço mínimo; só respeita montanhas eternas, campinas e vales perenes, pois estes, construções sólidas da natureza, têm caráter permanente e feições que lhes são análogas. Impetuoso no grau máximo varre, literal e metaforicamente, vilas e cidades, mostrando ao homem soberbo sua descomunal potência capaz de esmigalhar tudo e todos que se interponham no seu caminho, quase sempre errático. Se o furacão espraia seu poder destruidor por amplo espaço geográfico e atua por tempo dilatado de vários dias, existe sua versão mais breve, porém muito mais aguda e percuciente, autêntico pacote de violência concentrada: o tornado. Verdadeira verruma colossal e impiedosa, em minutos, corta cicatrizes no flanco da terra, desgalha árvores centenárias, dizima florestas e destrói patrimônios. Causa danos materiais, tira vidas e modifica a paisagem, exibe-se como se fora saltimbanco de má índole, movido de furor assassino. Após tornar patente sua força extraordinária, vai diluindo-se – consonante sua posição geográfica - em siroco, alíseo ou monção, sopros mais moderados que não causam maiores danos. Já agora, tendo cumprido seu destino de força da natureza, atenua-se ainda mais e torna-se fraca brisa, viração, corrente branda de ar. Aragem que acaricia o cabelo da criança distraída na calçada; que eleva levemente a saia rosa da moça alegre que cruza a rua; que seca o suor do atleta que corre no parque; que empurra com suavidade o ciclista afogueado; que balouça com languidez a roupa colorida no varal doméstico; que ondula o trigal maduro na campina distante; que ampara a queda suave da folha outonal; que empurra nuvens de algodão rumo ao horizonte remoto; que sustenta a aeronave tranquila no céu cerúleo. Agora é amigo, é companheiro e camarada. Agora, sabe-se útil, precioso, vital, mais até, fundamental. Adentra, benfazejo, os pulmões e outros órgãos de todos os seres que respiram, e é primordial para sustentar a vida que a natureza criou. Tem consciência plena que se não existisse, a vida no Planeta azul seria uma impossibilidade, a Terra seria uma rocha estéril e fria vagando solitária no espaço insondável. Vento que venta viçoso é vetor vital que vai levando vida ao viúvo vivaz que verseja e ao vetusto velhinho visionário. JAIR, Floripa, 02/10/09.
sexta-feira, 2 de outubro de 2009
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5 comentários:
Na verdade foi uma semana com bastantes acontecimentos dos movimentos da natureza pelo o mundo.
Todos esses fenômenos da natureza ultrapassam os limite do homem, eles não pedem desculpa quando chegam.Devem ser respeitados mesmo com suas fúrias. Pois como você mesmo relatou eles arrastam tudo pela a frente. Gostei muito da foto. Um alerta para todos nós.
Um abraço.
Jair. Belo texto, como sempre. Realmente o vento muitas vezes nos causa transtornos, mas, esse mesmo vento quando transformado em corrente branda, brisa, aragem etc é tambem motivo de inspiração para poetas. O compositor João do Vale, autor de Carcará, com seu liguajar sertanejo tem uma música chamada "Nas Asas do Vento" em que a certa altura nos diz: Deu meia noite / A lua abre um claro / Eu assubo nos aro / Vô brincá no vento leste. Ja, mestre Paulo Vanzolini parceiro de Toquinho na música "Na Boca da Noite", escreveu para a mesma os seguinte e lindos versos: O vento vai pra onde quer / A água corre pro mar / Nuvem alta e mão de vento / É o geito da água voltar / Morena se acaso um dia / Tempestade te apanhar / Não foge da ventania / Da chuva que rodopia / Sou eu mesmo a te abraçar. Este que vos escreve também tem seus momentos de poeta e num deles escreveu um longo rondó chanado "Na Brisa da Madrugada" que termina assim: Prepare os lençóis da cama / Abra a janela pra lua / Espere por quem te ama / Tire a roupa, fique nua / Deixe a porta encostada / Da nossa casa por que / Na brisa da madrugada / Vou voltando pra voce.
Grande abraço, Joel.
Cata-vento, ventania, ventosa, ventana todos termos derivados dessa força invisível que move moinhos e empina pipas. A gente não costuma pensar sobre o vento, mas ele está presente desde nossos primeiros passos até o fim, deste o nível do mar até a mais alta montanha, desde que o mundo começou até não mais sabermos. ô entidade danada de persistente. Abraços, Jorge.
Vento - exalação divina da natureza. Suspiro.
Caro primo.
Estou aprendendo muito com seus comentários inteligentes sobre os diversos assuntos que estão no seu blog.
Claro que preciso consultar o dicionário com frequencia, mas é uma agradável maneira de exercitar meu preguiçoso raciocinio.
Dois em especial me emocionaram:
O livro que volta para suas mãos, após tantos anos e o VENTO.
A narrativa do vento é tão linda!
Jair, você é o cara''. Eu,uma ESTULTA. aprendi com vc.
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