sexta-feira, 15 de outubro de 2010

A dúvida



Depois que os EUA lançaram as bombas nucleares sobre Hiroxima e Nagazaki (ou Urakami, vide meu texto “Revendo a história”) em seis e nove de agosto de 1945, originou-se uma polêmica que dura até hoje. O evento era necessário para abreviar a guerra, ou foi uma demonstração de força para não deixar qualquer dúvida sobre quem dava as cartas a partir dali? Diante da declaração de Truman que a bomba era essencial para poupar centenas de milhares de vidas americanas e finalizar a guerra alguns meses antes; que os generais japoneses haviam preparado a população do país para resistir literalmente com paus e pedras até o último habitante; e que as bombas, apesar de politicamente incorretas, pois atingiram mais alvos civis que objetivos militares, teriam poupado vidas japonesas, as quais seriam eliminadas em muito maior número se houvesse invasão das ilhas mais populosas, a imprensa e muitas autoridades de diversos países caíram de pau nos americanos alegando que o Japão já estava derrotado e que o país servira apenas como campo de teste para o exército americano. Vejamos o que diz Charles Mee, escritor crítico americano: “A liderança norte-americana tinha plena consciência de que, àquela altura da guerra no Pacífico, a derrota japonesa já estava consumada. A intenção de Truman de jogar a bomba foi, mesmo, intimidar os soviéticos. Em nome desse objetivo, o presidente ignorou as ponderações do seu secretário da Guerra, Henry Stimson, que tentou inutilmente convencê-lo a facilitar a rendição japonesa. A insistência de Truman em exigir do Japão a rendição incondicional em termos humilhantes, visava prolongar os combates até que houvesse condições técnicas de lançar a bomba”. É quase certo que também existisse um viés de vingança pelo ataque traiçoeiro a Pearl Harbor.

Nós, simples mortais, sempre teremos dúvida sobre quem é dono da verdade, não nos é dada a oportunidade de conhecer todos os elementos da equação, portanto, vale o chutômetro, tanto mais calibrado o pé que executa o petardo, quanto mais se conhece sobre o assunto. Como leio tudo que me passa pelas mãos sobre a guerra, e o faço desde que consegui decifrar palavras e seus sentidos aos sete anos, tenho a presunção de que meu palpite tem validade: Dou razão a Truman.

Agora, muitos anos depois, lendo o livro “O último trem de Hiroshima”, descobri este trecho bem interessante: “Nos últimos tempos as salas de aula das escolas foram convertidas em fábricas improvisadas para suprir de armamentos os soldados do castelo de Hiroshima. Os estudantes de engenharia mais velhos tinham a tarefa de calcular como fabricar gatilhos e outras partes de armas com madeira de lei disponível mais facilmente: recuperada de vizinhanças selecionadas pelo governo que abatera as árvores para fazer clareiras de proteção contra incêndios. Nas salas de aulas os cartuchos estavam sendo substituídos por uma liga de metal de menos qualidade, feita na maior parte por telhados de lata demolidos. Projéteis estavam sendo esculpidos em mogno, “para lutar em distâncias curtas”, haviam explicado. Espingardas feitas de madeira eram confeccionadas para serem distribuídas às crianças e suas mães. Todos sabiam que as pequenas armas não seriam eficazes por muito tempo se os americanos invadissem a cidade, mas os homens que planejaram a batalha final (destaque em negrito meu) decidiram que um ou dois disparos de cada cidadão dariam conta da situação por tempo suficiente. Em outras salas de aulas os estudantes afiavam lanças de bambu.“Isto é o que acontece a uma nação que perde a guerra”, observou um médico chamado Hachiya. “Balas de madeiras e lanças de bambu”.

Além disso, o ministro da guerra Anami, dizia que, mesmo com uma marinha impotente e as cidades em chamas causadas pelos bombardeios diários, ele acreditava fanaticamente em uma última e grande resistência através da qual o povo do Japão infligiria perdas inaceitáveis nas forças invasoras em terra, que as repeliria; ou o povo morreria tentando e nada restaria para os americanos conquistarem, mesmo porque iriam juntos com os japoneses para o inferno.

Diante dessa determinação jumental insuflada pelas autoridades aos japoneses, minha opinião é que, tal como os homens bomba da atualidade, os habitantes do Japão daquela época haviam engravidado pela audição de toda aquela baboseira de raça superior; de que o imperador Hiroito era “o cara”; que ele detinha poderes sobrenaturais porque fora ungido por Deus; e um besteirol da mesma espécie que se estendia por gerações, então eles realmente foram poupados por Truman. As bombas foram uma bênção para os que sobreviveram, e o preço que pagaram em vidas pelo fim da estúpida guerra foi bem menor do que se os EUA tivessem desembarcado nas ilhas de Hokkaido e Honshu, por exemplo. JAIR, Floripa 15/10/10.

6 comentários:

R. R. Barcellos disse...

- A lógica da guerra é fria e calculista, impiedosa e pragmática. A decisão de lançar as bombas foi tomada para poupar vidas de combatentes americanos, em primeiro lugar. "Poupar vidas japonesas" tem sabor indisfarçável de desculpa esfarrapada. O lema básico dos conflitos - sejam passoais ou internacionais - é:
- Farinha pouca, meu pirão primeiro!
- Abraços, amigo.

Leonel disse...

A história das lanças de bambu, eu li há muitos anos atrás no livro "Uma Ponte Para o Sol Nascente", de Gwen Terasaki, uma americana casada com um diplomata japonês que passou toda a guerra no Japão, portanto acho ser um fato confirmado as medidas desesperadas que estavam em curso.
Porém, eu acho que a guerra, se não estava vencida antes da primeira bomba, já estava antes da segunda.
Creio que, no ponto onde estava o projeto, eles iriam lançar mesmo as duas bombas, pois precisavam avaliar os efeitos em condições reais! Foi a Guernica dos americanos.
Na mnha opinião, poupar vidas americanas ou intimidar os russos foram fatores concorrentes, que não podem ser negados. Mas, acredito que independente deles, os lançamentos seriam feitos. Mas, isto é apenas a minha opinião.
Sei que você fez uma ótima pesquisa e que os fatos apresentados tem fundamento.
Aliás, um excelente trabalho, como sempre!

R. R. Barcellos disse...

- Complementando meu comentário: peguem a expressão "mesmo que seja verdade", coloquem-na entre parênteses e encaixem-na em qualquer lugar da terceira frase do primeiro comentário. Quanto ao resto, concordo plenamente com os amigos. Abraços.

Camila Paulinelli disse...

Olá,
Assim como ocorreu com o ataque ao Iraque (não entendo como Guerra contra o Iraque), os EUA estão sempre usando seu poderio a bel-prazer. Como acho que tudo no poder ocorre como em bastidores de cinema, nunca temos ou teremos acesso ao making off. Minha humilde opinião é a de que os EUA prepotentemente somente queriam demonstrar seu poder.
Beijos da nora,

Thereza disse...

Guerra, bomba atômica=destruição,horror e sequelas. Ambos os lados julgam ter razão. Concordo com a opinião da Camila Paulinelli e uso as mesmas palavras do seu pensamento: OS EUA ESTÃO SEMPRE USANDO SEU PODERIO A BEL-PRAZER.
Thereza Maria.

Mariza disse...

Olá Jair,

Ganhou uma fã, tanto vc como seus "pitacos", gostei muito. Já se tornou minha leitura matinal.
abço

P.S. obrigada pelo comentário/elogio no meu Blog, apareça sempre.