quarta-feira, 17 de julho de 2013

Cores



Desde sempre, por menos que tenhamos noção do porquê, estamos imersos em milhares de cores. Sejam cores reais da natureza que nos cerca como o verdejar da flora; o cerúleo de um céu límpido; o azul profundo de águas misteriosas de oceanos abissais; a extrema brancura de cúmulos e cirros que flutuam sobre nossas cabeças; os muitos matizes amarronzados dos solos; ou o arco íris das borboletas e das flores que são seus campos de pousos regulares. Por outro lado, também cores imagéticas ou abstratas com as quais “tingimos” fenômenos ou eventos, - muitas vezes com certa dose de preconceito - como por exemplo: “Com essa inflação o futuro é negro”; “Como vai? Tudo azul?”; “Ficou amarelo de medo”; “Estou verde de fome”; “Estou roxo de vontade!”; “Ao tentar responder me deu um branco”; "Estamos gastando uma nota preta com a visita do papa" etc.
Fisiologicamente, com exceção de cegos e de pessoas com grau de daltonismo extremo que possivelmente só enxerguem em preto e branco com variações de cinza, todos estamos mergulhados num mundo colorido. Além disso, torna-se comum associarmos cores de objetos mais conhecidos com outros, como quando dizemos: verde-bandeira, azul-marinho, verde-oliva, amarelo-ouro, vermelho-romã e uma miríade de outras associações que visam rotular com exatidão a que cor, matiz ou tom nós nos referimos. Também atribuímos “qualidades” ou “poderes” às cores: verde é esperança; vermelho é paixão; cinza é tristeza. E convencionamos códigos de cores que, o mais das vezes, tem como escopo alertar sobre perigo ou algum evento que deve ser observado por qualquer pessoa, independentemente seja ela alfabetizada ou não. Neste caso os exemplos mais observáveis são os sinais de trânsito com suas três cores – vermelha, amarela e verde, nesta ordem de cima para baixo, sempre.
Essa convenção planetal vale para qualquer nação e, sob a égide da segurança de pedestres e motoristas, não deve jamais ser alterada. Seria risível se não fosse trágico o que ocorreu na China de Mao durante a chamada Revolução Cultural que devastou aquele país de 1960 a 1966. Cabeças pensantes do PC chinês, cheios de elã patriótico eivado de xenofobia idiota, estabeleceram que a partir de certa data o vermelho dos sinais de trânsito significaria EM FRENTE  e o verde PARE, foi um caos só comparável ao caos maior que já se tornara a sociedade chinesa, frente aos julgamentos e execuções sumárias a que eram submetidos os chamados “intelectuais” daquele país. Chegou-se ao extremo de considerar intelectual o cidadão que simplesmente tivesse curso superior, falasse algum idioma além do nativo ou que exercesse uma profissão liberal, por exemplo. Bem, não é finalidade deste texto falar da China, mas lá, naquele nefasto tempo, o vermelho era a cor do BEM, as demais eram em diversos níveis menos boas que o vermelho. Felizmente a lambança pseudo patriótica da troca de cores só permaneceu por seis meses, os apedeutas chineses, discretamente, voltaram à convenção universal dos significados depois que ocorreram dezenas de mortes e centenas de feridos.
Mas vem da China também algo que quero comentar aqui. Quando eu tinha por volta de dez anos em Palmeira, no Paraná, houve uma “onda” de migração para àquele município de um povo eslavo agricultor que até hoje ainda se encontra lá plantando, colhendo e mantendo seus costumes. O curioso, e de certa forma misterioso para mim, era que os emigrantes eram (e ainda são) chamados de “russos brancos”. Na minha virtual e santa ignorância eu me perguntava: será que os demais russos são não brancos? Vermelhos talvez? Vermelhos pela cor da pele ou pela ideologia comunista, já que estes que aqui estão não seguem a mesma cartilha ideológica dos que lá ficaram? Eu não sabia e ninguém que eu tenha timidamente perguntado sabia. Russos brancos eram russos brancos ora! Não há o que saber mais! Fim, tá bom?
Pois é, durante quase sessenta anos vivi numa incômoda ignorância que, vez ou outra, me assaltava e cutucava minha mente em busca de uma resposta que não vinha. Neste ponto devo confessar que sou meio obsessivo quando se trata desses mistérios que não têm relevância alguma para a vida prática cotidiana. Eventos que não cheiram nem fedem como esse. Então, estava eu lendo um livro sobre guerras históricas esta semana, quando me deparei com parágrafo interessante: “Alguns escritores dizem que os hunos brancos eram caucasianos. Isto é uma bobagem tão grande quanto defender que os turcos azuis eram marcianos (azul é cor do leste). O uso de cores para indicar direções se originou na China, que também usava preto para norte, vermelho para sul e amarelo ou dourado para centro. Esse simbolismo foi adotado pelos nômades da Ásia Central, e daí vem a Horda Dourada, reino central do império mongol, e os mares vermelho e negro, respectivamente ao sul e norte da Turquia”.  Então fica assim: Preto = norte; vermelho = sul; azul = leste e; finalmente, branco = oeste. Sei agora que os russos brancos de minha querida Palmeira são oriundos do ocidente da Rússia. Acabou-se o mistério e esta noite posso dormir tranquilo, sem que me assaltem o sono hordas intermináveis de imigrantes eslavos furiosos, indagando: Por que somos brancos? Por quê? Por quê? Por quê? JAIR, Rosário, Argentina, 17/07/13. 

10 comentários:

Leonel disse...

Apesar de todas essas curiosidades coloridas, eu sempre ouvi a referência aos russos brancos como dissidentes do regime "vermelho"...
Até em filmes russos!
Abraços, Jair!

JAIRCLOPES disse...

Leonel,
Na verdade não é isso. Eles migraram da Rússia Imperial para a China bem antes da revolução bolchevique, em 1905. Já na China eram chamados de "russos brancos" em referência a suas origens no oeste do Império Russo. Parece que a dissidência com os Romanov nada tinha a ver com política e sim com religião, eles eram (e são) ortodoxos que não admitiam o poder absoluto dos imperadores, daí foram compulsados a migrar encontrando um cantinho despovoado da China onde se estabeleceram como agricultores bem sucedidos que sempre foram. Depois da revolução chinesa em 1949 mais uma vez se viram as voltas com o poder desmedido de Mao e resolveram migrar mais uma vez. Chegaram a Brasil na década de cinquenta quando eu os conheci em Palmeira. Abraços e obrigado por comentar, só assim pude me estender um pouco mais no texto onde não expliquei muito bem as coisas porque meus textos em geral se limitam a oitocentas palavras, JAIR.

Leonel disse...

OK!
Nunca é tarde para aprender mais uma...
Abraços!

Tais Luso de Carvalho disse...

Interessante esse texto. E eu que sempre imaginei que homem não estava nem aí pra cor nenhuma. Difícil de vocês, homens, saberem o que é azul petróleo, azul celeste, vermelho carmim, vermelho vaticano, verde-oliva, marrom castor, rosa pink, choque, rosa nenê... E você dá um show de bola com suas dúvidas seculares, indo da China à Rússia e desenvolvendo por aí outras curiosidades que eu nem sabia. Mas a gente aprende, e a duras penas chegamos lá. E sem amarelar! Ou clareando o jogo. rss

Abraços.

Reflexos Espelhando Espalhando Amig disse...

Faz tempo que aqui não venho...
Linda postagem.
Bjins te espero la no meu canto.
Catiaho Alc/Reflexo d'Alma

Zilani Célia disse...

OI JAIR!
AS CORES FARÃO PARTE DE NOSSAS VIDAS POR TODO O SEMPRE.

MUITO INTERESSANTE TEU POST.
ABRÇS
http://zilanicelia.blogspot.com.br/

Suzy Luz disse...

Olá Jair, que show de curiosidades coloridas, chinesas e russas, encontro aqui! Fico feliz que você agora possa dormir sossegado e agradeço a gentileza de ter-nos agraciado com sua recente descoberta, afinal nunca tinha me dado conta de que os mares Negro e Vermelho, por exemplo, são uma referência geográfica! Gosto demais de vir aqui, pois descubro essas coisas que ninguém mais, além do Jair, descobre!
E coloridíssimo seu post, do jeito que gosto! rsrsrs

Uma quinta-feira 'azul' pra você! Ou da cor que preferir... Abraço!

António Je. Batalha disse...

Estou alegre por encontrar blogs como o seu, ao ler algumas coisas,
reparei que tem aqui um bom blog, feito com carinho,
Posso dizer que gostei do que li e desde já quero dar-lhe os parabéns,
decerto que virei aqui mais vezes.
Sou António Batalha.
Que lhe deseja muitas felicidade e saúde em toda a sua casa.
PS.Se desejar visite O Peregrino E Servo, e se o desejar
siga, mas só se gostar, eu vou retribuir seguindo também o seu.

Shirley Brunelli disse...

Gostei de sua crônica, Jair, pois, além de colorir minha alma, aumentou o meu QI. Beijo e muita paz!

Diana L. Ramos disse...

Belíssimo e elucidativo post.Parabéns!