quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

O eleitor


O cidadão com relação ao Poder Público – federal, estadual ou municipal - tem muitas características que o definem: ele é o consumidor que faz a economia girar; é o contribuinte que aceita passivamente a fúria arrecadatória do estado; também é o usuário dos serviços, nem sempre bons, que o poder público põe a sua disposição; é, ou deveria ser, o fiscal da administração da coisa pública; e, por último, é o eleitor que escolhe quem deve ocupar o executivo por determinado tempo, ou deve legislar por certo período.

Direitos, deveres e atribuições dos cidadãos mudam em intensidade e alcance de país para país. Claro está que em países cujos regimes não sejam democráticos, os deveres dos cidadãos costumam ser desproporcionalmente maiores que seus direitos, quando estes existem. Nas democracias é natural que os direitos e deveres sejam mais ou menos equilibrados, tanto maiores aqueles quanto maior for o respeito que o Estado dedica a seus habitantes. No Brasil, desde o advento da República, teoricamente, nasceu o cidadão eleitor, aquele que decidiria a quem delegar o poder de gerir a coisa pública. Bem verdade que desde 1889 até a década de trinta do século vinte, os eleitores eram menos cidadãos que compareciam às urnas, e mais gado em currais que referendavam as escolhas dos poderosos. Passou a existir até as infelizes expressões: “eleições a bico de pena” e “votos de cabresto” os quais definiam com exatidão perversa os processos pelos quais os cargos eletivos eram ocupados.

A História registra que os eleitores brasileiros nunca tiveram muita ligação com os políticos os quais elegeram, nunca se preocuparam com o destino das promessas de campanha dos candidatos. Parece que, mesmo que seus votos tenham tomado destino da lata de lixo da história, nunca lhes interessou serem ativos cobradores das promessas dos homens públicos. Estranho comportamento, talvez explicado pela obrigatoriedade do voto. O eleitor se vê compulsado a comparecer às urnas, sob o risco de que se não o fizer perde sua condição plena de cidadão, contudo, como o voto é secreto, ele pode, a título de “protesto”, votar no palhaço Tiririca, votar em ninguém ou calcar qualquer número votando em quem ele não lembrará cinco minutos depois. Então como cobrar coisas de seu candidato? O quê cobrar? Há certa ligação entre votar como obrigação e deixar de fazer valer seu voto, embora essa atitude possa parece incoerente, niilista até.

Há democracias em que o voto não é obrigatório, daí o leitor só vota se estiver convicto daquilo que deseja, se for participativo e acreditar no sistema vigente e nos compromissos de seu candidato; ou não vota como forma de marcar sua posição com relação ao sistema ou ao momento político. Convicção e participação em geral estão vinculados numa fecunda cumplicidade em regimes democráticos sérios, no nosso arremedo de democracia a participação obrigatória às urnas eclipsa as convicções e esperanças que os sufragistas possam ter. Não sejamos ingênuos, não há como afirmar que voto não obrigatório remeterá imediatamente o eleitor à consciência de seus anseios e ao voto naqueles candidatos afinados com suas convicções, mas, com certeza, aqueles que se derem ao trabalho de sacrificar o lazer e comparecerem às urnas estarão muito mais comprometidos com o processo democrático eleitoral do que eleitores levados como gado ao sufrágio compulsório. JAIR, Matinhos, 01/01/11.

9 comentários:

vieira calado disse...

Podia-se aplicar o que diz,

ao meu país!

Um abraço

Chassot disse...

Estimado Jair Lopes,

vibrei com tua visita e teu elogio ao meu blogue. Isto é bom para que diariamente busca postar algo.

Visitei a tua editora e conheci tuas duas obras.

Estão na minha mira.

Com agradecimento e admiração

Attico Chassot

Leonel disse...

Como você bem citou, isto é um arremedo de democracia. O voto deve ser uma opção, não uma obrigação. Assim, só votaria quem realmente se define por algum candidato, e a abstenção teria significado!
Para falar a verdade, eu passei a ver democracia com reservas, pois em países dominados pela miséria e pela ignorância, não me parece justo que uma maioria desinformada decida quem vai governar sobre todos!
Fica muito fácil para demagogos paternalistas virarem ícones à custa de esmolas e falsas benesses!
Acho que democracia só pode ser valida em países onde a miséria e a degradação humana não sejam fatores numericamente significativos!
Caso contrário, são os cavalos escolhendo o destino da carruagem, e não o cocheiro!
Abraços!

Samara Rocha disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
R. R. Barcellos disse...

- Pergunto a mim mesmo quantos eleitores se lembram dos candidatos em que votaram no primeiro turno, e vejo-me sacudindo a cabeça, desanimado...

PS: Jair, lá em cima escapou-lhe "promessas de himens públicos", e embora a expressão seja pertinente, duvido que sua intenção tenha sido essa...

JAIRCLOPES disse...

Barcellos,
Obrigado pela observação que foi acolhida e reparado o lapso. Também acredito que a expressão "hímens públicos" poderia se aplicar, desde que esses senhores vivem se violentando e perdem a virgindade tão logo adentram a "coisa pública".

Dois Rios disse...

Oi, Jair!

Primeiramente quero agradecer as suas gentis e suaves palavras. Vindas de um "blogueiro que pensa" deixou-me, de fato, muito honrada.
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Quanto ao seu post, eu diria que os mais interessados na manutenção do voto obrigatório são os políticos do atraso, a velha elite política brasileira, que precisa do voto por inércia.

Um grande abraço,
Inês

Unknown disse...

Caro Jair, as suas colocações são perfeitas; é preciso vermos a democracia do voto como um instrumento de mudanças não como uma imposição ainda da época da Ditadura.
Parabéns pelo excelente blog que já faz parte das minhas indicações.

Cesar Maluche disse...

A corrupção é uma doença crônica do nosso povo, alcançando todas as classes e níveis culturais, o que exige a implementação de uma educação básica que valorize a ética e o combate à corrupção. Reformas de base em nossa legislação são necessárias ao desenvolvimento do nosso país.