Lembro que mais do que
realmente ver, eu sentia os eventos, era como um filme em 3D estivesse sendo
projetado diretamente no meu cérebro. Era a História do Universo que se
desenrolava ao alcance, se não dos meus olhos, pelo menos da minha mente ou de
algum outro sentido que não sei definir. Era a história da matéria que despertava
à minha frente quase ao alcance da mão. O Universo nascia num meio onde nada
havia, um zero absoluto cercado de vazio. No início surgiram as partículas
simples, sem estrutura. Como bolas de bilhar num movimento browniano, elas se
contentavam em se deslocar e entrechocar-se. Depois, nas etapas seguintes,
essas partículas se combinam e se associam. Começam a surgir as arquiteturas do
que viria a ser matéria mais complexa e, talvez, atuante em algum sentido.
Sentia-me como
sentado num gramado macio a beira de um bosque, olhando para o céu. Em meu
campo de visão as árvores balançam ao sabor do vendo como a embalar seus frutos
como filhos que se embalam para dormir. Eu escutava o tempo que, em absoluto
silêncio, realizava sua grandiosa obra, transcendentalizava. Essa escuta
aplicava-se ao todo, ao Universo. Pois é no fio do silencioso tempo que se
desenrola a gestação cósmica. A cada fração o Universo se revela mais e mais
complexo, as suas fímbrias, lentamente, perdem-se alhures, não há horizontes.
Como espectador deste desenrolar dos acontecimentos primevos e primordiais, eu
sabia que minha missão era testemunhar o aparecimento de novos elementos
cósmicos e novos seres ao cabo.
Então aplaudi o
nascimento dos primeiros átomos. Deixando os braseiros estelares, os núcleos
recém nascidos “vestem-se” de elétrons e formam os primeiros átomos. Assim
começa a evolução química. Os átomos se aliam em moléculas e poeiras
interestelares, e essas poeiras, reunidas em torno de estrelas em formação dão
origem aos planetas. Alguns desses planetas em convoluções adquirem mares e
atmosfera; ali a evolução química, catalisada por essas novas condições, se
acelera, criando moléculas que flutuam numa sopa primordial. De química a
evolução torna-se biológica e produz células e seres vivos. Eu vi.
Em alguns momentos
me senti inquieto, havia crises e distorções nesta suposta ascensão. Não
percebia eu que o Cosmo, como ser vivo que é, se contorce, se expande, se
contrai e se acalma em vários movimentos quase sempre inexplicáveis. Em certos
momentos especialmente instáveis, parecia que tudo era um grande engano e o
frágil equilíbrio que existia implodiria em caos irremediável. Mas o Universo,
apesar de hesitar e recuar algumas vezes, se reinventava e continuava seguindo
adiante.
Eu me perguntava:
onde nos levará esse caminho? Hoje a física nuclear nos permite conhecer a evolução nuclear. Ela nos explica como,
a partir daquelas partículas nucleares que as vi nascerem, milionésimos de
segundo após o que se convencionou chamar de Big bang, se formaram os primeiros núcleos atômicos no ventre
incandescente das estrelas. Lançados como projéteis para o espaço pejado de
partículas primordiais, os núcleos revestiram-se de elétrons. Atualmente a
radioastronomia e exobiologia molecular nos permitem reconstruir as grande
fases da evolução química das estrelas e o surgimento dos planetas primitivos.
E, finalmente, seguindo as revelações de Darwin, somos capazes de percebermos,
erguendo-se a nossa frente, a grande árvore
da vida: a evolução biológica que nos leva à inteligência humana que
permite deslindar esses mistérios da natureza.
Enquanto eu assistia
esse drama como em uma tela panorâmica com imagens em 3D, me assaltava a
pergunta: esse caminho rumo à extrema complexidade termina no homem? Santa
ingenuidade. De sã consciência não há como afirmá-lo, não nos é permitido
achar-nos o ápice da criação. O coração do Universo continua a bater no mesmo
ritmo. A força inicial continua com impulso rumo ao vir a ser. O sentido inicial é o mesmo e o nível da complexidade
não é possível de ser avaliado. É até viável que em outros planetas se tenham
processado avanços muito maiores, e que em outros mais, o impulso vital só
agora se faça sentir. Não nos é lídimo assegurar que somos únicos, como que
privilegiados por uma natureza tão pródiga em outros misteres. Como em “2001
uma odisséia no espaço”, que futuro desconhecido a gestação cósmica prepara
para nós? Que somos oriundos de primatas sabemos, mas o que nascerá do homem?
JAIR, Floripa, 16/04/2013.
3 comentários:
Somos apenas partículas infinitesimais em meio a este turbilhão de eventos e transformações...
E, ao mesmo tempo, nossas perspectivas de evolução são incalculáveis, pois a nossa constituição não se resume à continuidade matéria-energia.
A inteligência responsável por este processo ainda está longe de ser compreendida pela nossa mente...
Bela divagação, Jair!
grande jair
Muito bom!
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