terça-feira, 4 de junho de 2013

Eu vi



Lembro que mais do que realmente ver, eu sentia os eventos, era como um filme em 3D estivesse sendo projetado diretamente no meu cérebro. Era a História do Universo que se desenrolava ao alcance, se não dos meus olhos, pelo menos da minha mente ou de algum outro sentido que não sei definir. Era a história da matéria que despertava à minha frente quase ao alcance da mão. O Universo nascia num meio onde nada havia, um zero absoluto cercado de vazio. No início surgiram as partículas simples, sem estrutura. Como bolas de bilhar num movimento browniano, elas se contentavam em se deslocar e entrechocar-se. Depois, nas etapas seguintes, essas partículas se combinam e se associam. Começam a surgir as arquiteturas do que viria a ser matéria mais complexa e, talvez, atuante em algum sentido.
Sentia-me como sentado num gramado macio a beira de um bosque, olhando para o céu. Em meu campo de visão as árvores balançam ao sabor do vendo como a embalar seus frutos como filhos que se embalam para dormir. Eu escutava o tempo que, em absoluto silêncio, realizava sua grandiosa obra, transcendentalizava. Essa escuta aplicava-se ao todo, ao Universo. Pois é no fio do silencioso tempo que se desenrola a gestação cósmica. A cada fração o Universo se revela mais e mais complexo, as suas fímbrias, lentamente, perdem-se alhures, não há horizontes. Como espectador deste desenrolar dos acontecimentos primevos e primordiais, eu sabia que minha missão era testemunhar o aparecimento de novos elementos cósmicos e novos seres ao cabo.
Então aplaudi o nascimento dos primeiros átomos. Deixando os braseiros estelares, os núcleos recém nascidos “vestem-se” de elétrons e formam os primeiros átomos. Assim começa a evolução química. Os átomos se aliam em moléculas e poeiras interestelares, e essas poeiras, reunidas em torno de estrelas em formação dão origem aos planetas. Alguns desses planetas em convoluções adquirem mares e atmosfera; ali a evolução química, catalisada por essas novas condições, se acelera, criando moléculas que flutuam numa sopa primordial. De química a evolução torna-se biológica e produz células e seres vivos. Eu vi. 
Em alguns momentos me senti inquieto, havia crises e distorções nesta suposta ascensão. Não percebia eu que o Cosmo, como ser vivo que é, se contorce, se expande, se contrai e se acalma em vários movimentos quase sempre inexplicáveis. Em certos momentos especialmente instáveis, parecia que tudo era um grande engano e o frágil equilíbrio que existia implodiria em caos irremediável. Mas o Universo, apesar de hesitar e recuar algumas vezes, se reinventava e continuava seguindo adiante.
Eu me perguntava: onde nos levará esse caminho? Hoje a física nuclear nos permite conhecer a evolução nuclear. Ela nos explica como, a partir daquelas partículas nucleares que as vi nascerem, milionésimos de segundo após o que se convencionou chamar de Big bang, se formaram os primeiros núcleos atômicos no ventre incandescente das estrelas. Lançados como projéteis para o espaço pejado de partículas primordiais, os núcleos revestiram-se de elétrons. Atualmente a radioastronomia e exobiologia molecular nos permitem reconstruir as grande fases da evolução química das estrelas e o surgimento dos planetas primitivos. E, finalmente, seguindo as revelações de Darwin, somos capazes de percebermos, erguendo-se a nossa frente, a grande árvore da vida: a evolução biológica que nos leva à inteligência humana que permite deslindar esses mistérios da natureza.
Enquanto eu assistia esse drama como em uma tela panorâmica com imagens em 3D, me assaltava a pergunta: esse caminho rumo à extrema complexidade termina no homem? Santa ingenuidade. De sã consciência não há como afirmá-lo, não nos é permitido achar-nos o ápice da criação. O coração do Universo continua a bater no mesmo ritmo. A força inicial continua com impulso rumo ao vir a ser. O sentido inicial é o mesmo e o nível da complexidade não é possível de ser avaliado. É até viável que em outros planetas se tenham processado avanços muito maiores, e que em outros mais, o impulso vital só agora se faça sentir. Não nos é lídimo assegurar que somos únicos, como que privilegiados por uma natureza tão pródiga em outros misteres. Como em “2001 uma odisséia no espaço”, que futuro desconhecido a gestação cósmica prepara para nós? Que somos oriundos de primatas sabemos, mas o que nascerá do homem? JAIR, Floripa, 16/04/2013. 

3 comentários:

Leonel disse...

Somos apenas partículas infinitesimais em meio a este turbilhão de eventos e transformações...
E, ao mesmo tempo, nossas perspectivas de evolução são incalculáveis, pois a nossa constituição não se resume à continuidade matéria-energia.
A inteligência responsável por este processo ainda está longe de ser compreendida pela nossa mente...
Bela divagação, Jair!

Daniel Andrade disse...

grande jair

Diana L. Ramos disse...

Muito bom!