quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Os Índios


Como já escrevi algumas vezes, em especial no conto “O Pacote”, meu avô materno era autêntico indivíduo da tribo Kaingangue, adotado e aculturado por uma família “branca” da Lapa no Paraná. Pois é, em decorrência dessa ancestralidade e mais meia dúzia de antecedentes com um pé (às vezes dois) na América pré-colombiana considero-me mais ou menos silvícola. Talvez meio-indígena, quem sabe.

Ser parte americano nativo não é estranho e nem deveria, pois, quando os portugueses iniciaram a colonização vieram sozinhos, a maioria era composta de homens solteiros e os casados em geral não traziam suas mulheres porque o ambiente na colônia era muito inóspito. Em decorrência, quando os colonos aventureiros se deparavam com as nativas “em pelo”, como se dizia, não resistiam à abstinência e acasalavam-se, com ou sem consentimento das pobres inocentes. Daí, desde o início, passou a existir os indivíduos meio-indígenas-meio-portugueses que também cruzaram, tanto com semelhantes como com portugueses e nativos, sem discriminação de qualquer espécie. Vieram os escravos negros e a miscigenação prosseguiu no mesmo ritmo. Portanto, ninguém, absolutamente ninguém que tenha nascido neste país e tenha descendência do colonizador português, pode dizer que não tem uma gota de sangue negro, tupiniquim, guarani, tamoio, guajajara ou outra nação, que eram muitas as que no Pindorama existiam quando os lusos por aqui aportaram.

Segundo os antropólogos e arqueologistas, os habitantes do continente americano descendem de populações advindas da Ásia, sendo que os vestígios mais antigos de sua presença na América, obtidos por meio de estudos arqueológicos, e datação por carbono 14, estão entre 13 e 11 mil anos. Todavia, ainda não se chegou a um consenso acerca do período em que teria havido a primeira leva migratória, há indícios no Piauí que indicam data anterior, algo em torno de 16 mil anos.

A versão que os antropólogos americanos adotam, é que os povos indígenas que hoje vivem na América do Sul são originários de povos caçadores que aqui se instalaram, vindos da América do Norte através do istmo do Panamá, e que ocuparam virtualmente toda a extensão do continente há milhares de anos. De lá para cá, estas populações desenvolveram diferentes modos de uso e manejo dos recursos naturais e formas de organização social distintas entre si. Contudo, uma nova análise volta a dar peso à hipótese de que os primeiros humanos a chegar às Américas eram gente com aparência bem distinta da dos índios atuais, mas mais semelhante à de africanos e nativos australianos. Os antropólogos brasileiros Mark Hubbe e Walter Neves, junto com Katerina Harvati, da Universidade de Tübingen (Alemanha), publicam os resultados na última edição da revista científica de acesso livre "PLoS One". Após analisar os crânios dos primeiros americanos e compará-los com os dos indígenas mais recentes e com outras populações do passado e de hoje em dia, o trio buscou a melhor maneira de explicar as diferenças entre os índios atuais e os crânios mais antigos do continente. Qualquer que seja a origem dos nativos que aqui se encontravam em 1500, ainda está aberta a discussões e provas.

O processo de colonização levou à extinção muitas sociedades indígenas que viviam no território dominado, seja pela ação das armas, seja em decorrência do contágio por doenças trazidas dos países distantes, ou, ainda, pela aplicação de políticas visando à "assimilação" dos índios à nova sociedade implantada, com forte influência européia. Calcula-se que no Brasil viviam em torno de seis milhões de silvícolas por ocasião do “descobrimento”, hoje talvez existam menos de 200 mil, então, resta-nos o consolo de saber que a descendência Americana está em nosso sangue, e não nas florestas ou regiões remotas do país. Salvo pouquíssimas tribos arredias como dos índios Curukangas, que apenas foram vistas de relance pelo ar e fotografadas nos anos noventa, as demais estão assimiladas ou degradadas cultural e fisicamente. Podemos dizer: indígenas puros e culturalmente isolados são virtualmente inexistentes. Então fica uma constatação: índios somos nós, ou pelo menos nós que assumimos nossa ancestralidade aborígine. Minha parte assumo, sou nativo! JAIR, Floripa, 21/01/11.


5 comentários:

Anônimo disse...

Caro 1S Barbosa,
Gostei muito do teu texto sobre nossa sivilcularidade, muito legal, eu por exemplo sou neto de um "Bugre" evadido do Uruguai, mas como eu sempre comento, haviam os nossos bravos indios aqui no meu Rio Grande, depois vieram os soldados para o Forte Jeseus Maria José (naquela época chamado de presidio) localizado em Rio Grande, as putas eram capturadas no Rio e trazidas para o Rio Grande para serem esposas dos soldados, e depois os escravos africanos. O que eu quero dizer, é que o verdadeiro Gaucho tem na sua base familiar, um indio, um soldadu, uma puta e um negro.
abração
Fabio

Leonel disse...

Jair, eu sou contra essa história de manter os índios como inimputáveis, irresponsáveis e cheios de privilégios. Todos tem suas tradições e eu creio que devem ser preservadas e celebradas nas suas festas e eventos marcantes, mas isto não deve impedir que os povos indígenas sejam realmente integrados à civilização, com direitos e deveres, sendo responsáveis por seus atos, ao invés de serem tratados como "crianções" que tudo podem e ignoram as leis!
E, como você bem falou, nosso país é, queiramos ou não, formado por uma baita mistura!
Ótimo post, Jair!

R. R. Barcellos disse...

- A nossa carga genética já está tão espalhada e misturada que não faz sentido pesquisar "árvores genealógicas" - a não ser, talvez, como curiosidade ou em pesquisas antropológicas ou sociológicas. Mas o que é lamentável é a perda de valores culturais neste processo de "aculturamento forçado" - principalmente no que se refere ao trato com a natureza.

J. Muraro disse...

Muito ótimo! Você consegue colocar os assuntos polêmicos com muita naturalidade. Gostei, continue assim.

Maria Emilia Xavier disse...

Adorei o tema e como disse é bem legal te ler, é como se converssássemos. Eu sou bisneta de filha de índia com negro por parte de pai e que foi "laçada" pelo meu bisavô que era Português.Realmente tens razão, ninguém que aqui tenha suas origens escapa dessa mistureba do bem.