Na verdade o nome do
filme em português é “Não me abandone jamais” algo bem próximo do título inglês
“Never let me go”, título de uma
música que a protagonista Kathy H. ouve em fita cassete em várias ocasiões.
Se houver uma
palavra que sirva para sintetizar a película será inquietante, e o sentimento que causa no espectador, eu diria que é
um grande desconforto. A história se
passa na Inglaterra e inicia nos anos 70 do século passado, portanto é uma
ficção científica contemporânea, se assim se pode dizer. Sabe-se através de um
narrador que as doenças todas haviam sido vencidas pela medicina em 1952 e que
em 1967 a expectativa de vida é de cem anos. A nós, espectadores, parece uma
notícia destituída de sentido.
Trata-se de uma
geração de crianças internadas num educandário de nome Hailsham, um estabelecimento isolado do mundo externo e com
padrão rígido de educação. Às crianças lhes é incutido que o mundo fora dos
muros é hostil e até mortal, não lhes sendo permitido jamais sair das
dependências do colégio. As referências das crianças são apenas seus
orientadores, os quais dizem que elas são “especiais”, nenhuma informação exterior
clandestina deverá ser considerada. Nada escapa do patrulhamento rígido de suas
orientadoras.
Contudo, uma professora nova, estranhando que eles ignorem tudo
sobre si mesmos, um dia lhes conta que eles são clones destinados apenas à doação de órgãos, diz-lhes ainda que não
existe futuro para eles, quando receberem ordens farão duas ou três doações e
depois “finalizam”, eufemismo que disfarça a morte prematura e compulsória que
terão. Todos ficam sabendo que têm uma vida curta e sem qualquer sentido, são
considerados apenas “peças de reposição”. Algo angustiante. Mas a professora
que lhes contou tudo é demitida, então fica claro que não há outra escolha.
Quando atingem a adolescência os jovens são transferidos para
uma fazenda onde encontram outros também com o mesmo destino, mas criados em
outros educandários e supostamente mais cientes do “mundo lá fora”. Neste novo
local circulam alguns boatos que se um casal estiver apaixonado e entre eles
houver “amor verdadeiro”, a instituição a qual pertencem poderá dar-lhes uma
prorrogação de vida. Ou seja, lhes será concedido três ou quatro anos a mais de
vida até “finalizarem”, algo bem atraente para desesperançados clones que não
têm futuro.
Bem, os protagonistas Kathy, Ruth e Tommy formam um triângulo
amoroso em que Kathy e Tommy se amam, mas Ruth, sem explicação, introduz-se
entre os dois e faz de Tommy seu amante. Kathy, magoada, não deixa de ter
amizade com eles, mas torna-se amargurada. Por esse motivo, ela resolve ser cuidadora, ou
seja, uma espécie de assistente social que dá conforto e acompanha os doadores
nas suas internações para doação; uma forma de adiar seu destino e de se
afastar dos dois.
Passa algum tempo e Kathy, como cuidadora, acaba encontrando
Ruth a qual não vê há dez anos. Ruth já fez duas doações e fará em breve uma
terceira, o quê, quase com certeza lhe causará a “finalização”. Então é o
momento que Ruth reatar a amizade com Kathy e ambas reencontrarem Tommy que se
encontra em outra localidade.
Bem, não é o caso de contar o fim do filme e tampouco falar
como cada um vê sua curta vida em particular. A história nos convida a uma
profunda reflexão sobre vida e morte, sobre o objetivo de porque estamos aqui.
Será que somos apenas peões sem outro destino que não morrer, seja uma morte
“gloriosa” por uma causa, como supostamente morrem os soldados na guerra; ou
morte comum num leito de hospital? E mais, seja qual for o fim, será um fim de
vida que não dá sentido ao ato de viver? Algo assim: A vida é só isso?
Além disso, a certa altura, os protagonistas através de
“ouvir dizer”, fazem conjeturas de quem seriam seus “modelos”, ou seja, quem
seriam as pessoas que haviam fornecido o material genético que lhes deu origem.
Chegam à conclusão que eram pessoas da escória, gente menos importantes cujas
células agora transformadas em clones
servem apenas para repor órgãos de gente
de primeira, pessoas que realmente contam. É arrepiante, mas os clones
parecem sugestionados por Pavlov, não ficam indignados ou questionam essa sua
categoria de pessoas descartáveis,
são passivos e só almejam viver um pouco mais, ganhar um tempo adicional de
vida. Nesta altura pode-se fazer uma ligeira alusão aos nazistas quando viam um
mundo nazificado onde subumanos, como eles chamavam os eslavos, por exemplo,
seriam apenas escravos destinados a fornecer mão obra, suor e sangue para uma
vida plena dos “arianos”.
Não sei, mas a obra dirigida por Mark Romanek, baseada num
livro de Kasuo Ishiguro, escritor anglo nipônico, merece ser assistida, pensada
e o jamais do título deveria ser o
mote para refletirmos: jamais algo
semelhante deve acontecer, sob o risco de nós perdermos para sempre aquele dom
que supostamente é o que nos distingue dos outros animais e que chamamos de humanidade. JAIR, Floripa, 14/03/12.
9 comentários:
Jair, vou assistir esse filme. Muito boa sua ótica. Um abraço.
Meu caro Jair,
fiquei seduzido para ver o 'Jamais...!' Tua resenha desperta curiosidade, e... isso é muito bom,
attico chassot
OBRIGADO por não precisarmos mais provar que não somos robôs, apenas ciborgues
Realmente, já vi esse filme e me impressionou muito. Gostei do teu comentário, parabéns.
Jamais... assistirei!
Abraços, amigo.
Taí, enciclopédico amigo! fizeste uma postagem referente a uma película que eu ainda não assisti! Vou procurar ver, pois não posso negar que fiquei curioso depois de ler sua resenha!
Muita paz!
Pois é, sua resenha está ótima, até dá vontade de ver, mas não sei não... Não faz muito que assisti a vários documentários, num canal fechado, sobre o Holocausto. Em sequencia. Foi dose pra mamute! Não aguento ver tanto sofrimento.
Abraços, jair.
Jair, interessante!
Eu já assisti a um filme com o mesmo tema, mas só que os clones eram de pessoas ricas e famosas, mantidas em uma instituiçãopara servirem de doadores para seus próprios originais! Acho que o nome era A ILHA.
Mas, com certeza, vou correr atrás deste, ainda mais com essa tua recomendação!
Abraços!
Muito interessante... Valeu pela dica de filme!
Abraços!
Leonel,
Já assisti a "Ilha" e "Jamais". Asseguro que este é muito superior àquele.
Augusto
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