sexta-feira, 2 de março de 2012

Sandices energéticas

Desde que o homem surgiu no Planeta sentiu necessidade de usar energia para facilitar sua existência. Não há consenso sobre quando o Homo usou pela primeira vez o fogo, alguns cientistas afirmam ter encontrado vestígios de fogueiras acendidas há duzentos mil anos, outros admitem que o fogo começou a ser utilizado pelo homem em torno de quarenta mil anos atrás. De todo modo, seja quando for, o fogo foi a primeira experiência humana na utilização de fonte de energia externa para seu conforto e segurança. Provavelmente a partir daí passou a assar os alimentos, aquecer as habitações e espantar animais com a nova fonte disponível, estava inaugurada a corrida tecnológica do uso de energia.
O fogo permitiu que os humanos primitivos escalassem um degrau importante rumo à civilização e, em consequência de sua posição agora um pouco mais avançada, enxergaram a possibilidade de dar novos passos. Não se sabe quando exatamente, mas tribos vizinhas de rios, lagos e dos litorais descobriram as águas como via de transporte, de modo que elas passaram a ser suas “estradas” para alcançar novas paragens, a força de remos, utilizando as correntes dos rios ou pelo uso do vento aproveitado em velas rudimentares feitas de palhas de coqueiros. Força das águas e vento parece que foram “descobertas” simultâneas.
Enquanto isso, povoações do interior aproveitavam a tração animal como força motora para puxar carros com rodas nas campinas e trenós nas regiões geladas. A roda acabara de ser “inventada” depois que se observou o corte transversal de troncos de coníferas. A humanidade estava montada em rodas e jamais abandonaria essa fantástica ferramenta que ainda hoje move o mundo.
Há que se observar que tanto o fogo como os meios de transporte se faziam a custa de madeira, mas como havia abundância desse material em relação a baixa densidade populacional, queima ou uso de madeira para a confecção do que quer que fosse não representava perigo para as florestas. Mesmo assim, existem indícios que carvão mineral na Europa central e petróleo que aflorava em certas regiões do chamado Crescente Fértil foram usados pelos povos primitivos em suas fogueiras. Uso artesanal, esporádico e localizado, mas indicando o potencial dessas duas fontes para o futuro.
Em decorrência compulsória dos novos níveis de progresso alcançados pela civilização, novas fontes de energia foram sendo usadas sem que as mais antigas fossem desprezadas, pelo contrário, quando mais crescia, mais a humanidade queimava lenha, fazia os animais puxarem seus trenós, arados e carros, usava o vento e as correntes de água para impulsionar seus barcos, mas não abandonara os remos, escravos eram uma força a ser aproveitada nas galeras e trirremes antigas.
Então, por volta de quatro mil anos atrás, no País de Gales, registrou-se a primeira mineração industrial para uso de carvão como combustível. Talvez não seja coincidência que a revolução industrial usando carvão para produzir vapor tenha ocorrido na mesma região. Esse mineral formado de restos orgânicos antigos soterrados e submetidos à pressão e calor muito acentuados, foi o que faltava para o homem finalmente “dar um tempo” para a madeira que escasseava em alguns lugares em que o desmatamento foi particularmente cruel. Em regiões onde havia poucas árvores e a turfa era abundante, esta era (ainda é) usada para queimar nas lareiras. Na Escócia e na Irlanda existem muitos campos de turfas aproveitados principalmente pelas populações rurais.
O xisto betuminoso que é uma rocha metamórfica contém entre cinco e dez por cento de óleo que pode ser aproveitado. Hoje em São Mateus do Sul no Paraná, a Petrobras está explorando jazidas importantes de xisto betuminoso com vistas a produzir combustível. Estima-se que as reservas de xisto no Planeta somem um potencial energético três vezes maior que as reservas de petróleo conhecidas. Então por que não se aproveita mais essa fonte de energia? Porque ainda não existe tecnologia que o torne viável economicamente. Talvez quando as reservas de petróleo estiverem nos estertores valha à pena explorar intensamente o xisto.
Mas o mundo foi se desenvolvendo, novas conquistas e descobrimentos alargavam o horizonte dos homens. Foi assim que em 1850, James Young, na Escócia, descobriu que o petróleo podia ser extraído do carvão e xisto betuminoso. O petróleo no início foi destilado e o querosene resultante era usado para iluminação em substituição ao óleo de baleia, imagino que os cetáceos devem ter visto com alívio a descoberta do petróleo. Depois, a história do petróleo é o que se sabe, o Planeta se convulsiona toda vez que algum árabe de maus bofes resolve acrescentar mais alguns bilhões de petrodólares a sua fortuna já bestilhorária.
Só que a humanidade foi crescendo na medida em que as fontes de energia se tornaram mais abundantes e forneceram meios para maior produção de alimentos e conforto, e isso não podia ser mais nocivo para o Planeta. Hoje grande parte dos cientistas e até de pessoas comuns sente que essa conduta irresponsável como se as fontes de energia fossem eternas é uma estultice, sentem que a civilização está numa encruzilhada: continua cega e vai ao encontro do desastre final e irreversível ou repensa seu gasto energético e trilha novos caminhos menos catastróficos.
Dá para desconfiar que os cartéis petrolíferos que controlam a economia do mundo todo, estão mancomunados (antes que o leitor pense, devo esclarecer que não acredito em teorias conspiratórias) para continuar nesse status quo até que o mundo se exploda, contanto que seus ganhos megalodônticos não sejam afetados. Parece que o “foda-se o mundo” é a política deles. Como dizia Hobbes: “O homem é o lobo do homem”. Coitado do Canis lupus, ser comparado com esse bípede imbecil!
De qualquer forma, estamos no limiar de alguma mudança muito séria e radical no modus vivendi do homem predatório, novas fontes de energia renováveis TERÃO que ser exploradas senão o fim virá mais rápido que se imagina. O crescimento populacional e a melhoria de vida dos países antes terceiro e quarto mundistas, requerem trocentos mais por cento de incremento de energia. De onde poderá sair tanta energia assim? JAIR, Floripa, 30/01/12.

5 comentários:

Attico CHASSOT disse...

Meu caro colega de blogares,
do bem posto texto fico na sua abertura. É muito provável que ao ler mais esta ‘sandice energética’ nos transportemos ao cinema.
A cerca de tempos tão distante quanto o que tu nos leva na abertura da edição, talvez pudéssemos afirmar: os filmes nos permitem visitar os eventos ocorridos ou imaginados e também, em muitas situações nos levam a ver o antes inimaginável. Parece que a maioria das cenas que presenciamos em ‘A guerra do fogo’ (1981) não teria sido por nós imaginadas, não fosse o talento e a criatividade de Jean Jacques Arnaud e sua equipe, que depois desse filme foi também o premiado diretor em ‘O nome da Rosa’ (França, 1986) e ‘Sete anos no Tibet’ (França, 1997), dois títulos excepcionais na filmografia mundial.
Devo ter visto ‘A guerra do fogo’, por usá-lo no ensino de História e Filosofia da Ciência mais de uma dezena de vez. Sempre me emociona.
O doloroso que então, como agora, a energia (o fogo, o petróleo...) continue a catalisar guerras. Por ocasião da Guerra do Golfo (1989), entre muitas manifestações de protesto que ocorreram contra a invasão do Kuwait, vi um pequeno cartaz na frente da casa na 10, Downing Street — residência do Primeiro Ministro, então a senhora Thatcher —, em Londres. Este simplesmente dizia: ‘E se no Kuwait crescesse apenas cenoura’. O petróleo é o novo nome do fogo nas guerras modernas.
Parabéns por energizares nossa imaginação

attico chassot
naine

R. R. Barcellos disse...

Bípede imbecil é o escambau!
Não vamos generalizar!
Afinal de contas está aí você, estão aí os seus leitores (alguns), que fazemos (eu me incluo) exceção à regra. E se a regra é contra nós, parafraseemos o gênio: tanto pior para a regra!

Abraços.

Unknown disse...

A busca por uma maneira de iluminar, aquecer, nutrir o breu da noite, faz parte querer de todas as civilizações. Lembrei-me do mito de Prometeu que, por dar o fogo à sua criação, o homem, foi severamente castigado por Zeus.Um castigo análogo certamente se dará com aquele que tentar transpor com uma nova opção de energia.Há muito interesse, como dito em seu texto, que se mantenha o combustível fóssil em voga. Desgraça para humanidade!

Reforçando a lista de longa-metragens, proposta por CHASSOT, eu incluo o filme Sangue negro, com Daniel Day-Lewis.

Muita paz!

Professor AlexandrE disse...

Mais uma postagem criativa, interessante e de alta qualidade!
Parabéns!!!

Leonel disse...

Caro Jair:
Gostaria de destacar alguns pontos do teu brilhante post:
1 - É urgente que se estabeleça um controle da natalidade em âmbito mundial: não adianta os ricos se limitarem a um par de filhos, enquanto os miseráveis têm uma dúzia!
2 - Espero que, quando finalmente as reservas petrolíferas ou os motivos econômico-políticos se esgotarem, não se voltem para as jazidas de xisto, mas "liberem" as formas de energia menos poluentes, atualmente travadas e confinadas a sete chaves pelos interesses financeiros imediatistas.

3 - Só como ilustração, no final da II Guerra, a Alemanha, após desistir de se apossar das reservas russas de petróleo dos Urais, chegou a desenvolver métodos desesperados de extrair petróleo do xisto, a custos astronômicos e inviáveis...

Excelente blogada!
Abraços, amigo!

P.S.:
Essas palavrinhas são um saco!!!
E se eu quiser ser um robô???